‘Batman e Robin’ da PM se separam, mas continuam no combate ao crime

Os militares: Edilson dos Santos e José Batista Chiovitti (Foto: Diléa Silva)
Da reportagem

Depois de quase quatro anos “tirando” os criminosos das ruas, a dupla de policiais militares Edilson dos Santos e José Batista Chiovitti dos Santos, da 2ª Companhia do 22o Batalhão de Polícia Militar de Tatuí, não está mais junta.

Os agentes atuaram em parceria no patrulhamento da PM e têm média de três flagrantes por turno de serviço e mais de 200 prisões anuais no currículo. Pela produtividade – considerada acima da média -, foram apelidados, por colegas de trabalho, como “Batman e Robin”.

O nome vem dos super-heróis, conhecidos nas histórias em quadrinhos por atuarem contra o crime, e, com os policiais da companhia tatuiana, não é diferente. A O Progresso, os dois contam como “tiraram o sossego” dos criminosos.

Santos e Chiovitti iniciaram a carreira militar em 2012 e vieram trabalhar em Tatuí em 2015 – mesmo ano em que foram promovidos a cabo da PM e começaram a atuar juntos na equipe “C” da companhia.

Em 2017, a equipe se dissolveu e os dois passaram a trabalhar na mesma viatura. A parceria seguiu até março de 2019, quando questões internas do batalhão acabaram afastando a dupla.

Levantamento da PM mostra que, somente no período em que atuaram em parceira, mesmo com férias, licenças e afastamentos regulares, os dois foram responsáveis por 16,9% do total de flagrantes da companhia.

Conforme o relatório, entre 2017 e 2019, a dupla efetuou 163 dos 965 flagrantes na cidade, sendo responsáveis por 69 de um total de 300, em 2017 (23%); 64 de 326, em 2018 (19,63%); e 30 dos 339, em 2019 (8,84%).

No último ano do relatório, o percentual aparece mais baixo devido ao tempo de atuação, já que os dois trabalharam juntos até março e o número considera o total de flagrantes da companhia até dezembro.

Quanto aos resultados obtidos, ambos afirmaram: “Trabalhamos com amor pela profissão, não gostamos de bandido, sabemos tratar com respeito a população ‘de bem’ e saímos para a rua para atuar de verdade, fazer sempre a mais, não apenas o básico”.

De acordo com Santos, o “a mais” era trabalhar com informações. “Nós sempre trabalhávamos informados sobre a atuação dos bandidos na cidade e íamos onde o criminoso estava. Não esperávamos ele vir até nós”, garantiu.

Além disso, o militar apontou que, por trabalhar “incisivamente contra o crime”, eles acabaram conhecendo os responsáveis pela criminalidade, a forma de atuação, os companheiros e as passagens que cada um dos bandidos já tinha pela polícia.

“Não tinha um bandido que chegava e falava que não tinha passagem, a gente conhecia todo mundo e o passado dentro do crime. Quando viam que a abordagem era nossa, nem tentavam ludibriar a equipe, porque sabiam que não iam conseguir. Assim nós prendemos muita gente”, argumentou Santos.

Segundo os militares, mais de 80% das ocorrências foram por tráfico de drogas e sempre com mais de um envolvido. Outras, também frequentes, envolveram furtos e roubos em estabelecimentos, residências e veículos.

“Tinha envolvidos com o chamado microtráfico e muitos casos de prisão de responsáveis pela distribuição. Nós tínhamos informação, íamos atrás e conseguíamos chegar aos donos das biqueiras”, detalhou Chiovitti.

Os militares ressaltaram que o enfrentamento ao tráfico de entorpecentes é uma das maiores preocupações da PM. Para eles, a repressão, o planejamento e as ações de prevenção realizadas pelas forças de segurança não são suficientes para resolver o problema.

“Não é exclusivo de Tatuí, acontece em todo lugar, mas é como enxugar gelo. Nós prendemos, a pessoa cumpre o tempo determinado de prisão, mas o problema continua, pois envolve muito mais setores da sociedade”, pontuou Chiovitti.

Ele apontou que as drogas também são uma questão de saúde pública, de educação, falta de acompanhamento familiar e de outras áreas que vêm antes da atuação das forças de segurança.

“Nós ficamos na ponta da lança e pegamos o resultado daquilo que faltou. Tudo isso é muito difícil de combater, mas não desistimos. Sabemos que uma andorinha só não faz verão, mas fazemos nossa parte. Desde que nos formamos, corremos atrás para tentar melhorar a segurança pública”, afirmou Chiovitti.

A dupla ficou conhecida nos meios policiais pelo trabalho atuante. O escrivão da Policia Civil José Wanderley Soares, que trabalha na Central de Flagrantes da Delegacia Central, conta que atendeu muitas ocorrências apresentadas pelos dois.

“Tem muitos policiais bons aqui em Tatuí, mas os dois se destacavam. Iam atrás dos bandidos, e, quando estavam na viatura, o pessoal do plantão já sabia que ia ter mais serviço. Eles trabalhavam muito”, comentou o policial civil.

A atuação dos militares também teve consequências dentro da corporação, na qual foram reconhecidos com honrarias, além de terem recebido moções de aplausos e congratulações na Câmara Municipal. Entretanto, nem sempre os resultados das ações dos policias foram positivos.

Com o índice de flagrantes por turno de trabalho, eles também acabaram chamando a atenção dos criminosos. Com isso, a vida privada foi afetada. Eles revelam ter sofrido ameaças, atentados, e que não têm liberdade para momentos de lazer em família, por questão de segurança.

A legislação brasileira também é elencada como um ponto de dificuldade para a atuação dos militares. Segundo eles, em alguns casos, as leis dificultam que os infratores permaneçam na cadeia – a maior parte, nos casos de furto.

Conforme o Código Penal Brasileiro, as penas de furto variam de seis meses a oito anos de reclusão, dependendo da natureza e das características do caso. Porém, como boa parte das ocorrências é classificada como “leve”, existe a possibilidade de fiança e que o réu possa responder o processo em liberdade.

“Às vezes, a gente tem o maior trabalho para prender um criminoso, principalmente o furtador. Fica o dia todo procurando, consegue prender, e ele sai da cadeia antes de nós policiais, que temos que ficar sendo ouvidos. Ele sai pela porta da frente e já está cometendo furto de novo”, sustentou Santos.

“Também tem os casos de ‘saidinhas’, que acabam complicando. Quando eles saem na rua, voltam a cometer crimes, e aí precisa de uma nova ação da polícia para pegar um cara que já estava contido no sistema prisional”, acrescentou Chiovitti.

Nos outros casos, em que o inquérito policial se transforma em processo penal, para cumprir as leis e fazer com que os criminosos sejam punidos, os dois revelam manter uma espécie de “dossiê” dos flagrantes efetuados.

Chiovitti explicou que o material era estudado detalhadamente como preparação para as audiências – que, muitas vezes, aconteciam nos dias em que os militares estavam em folga.

“Pode passar um ano ou dois até nos chamarem para prestar o depoimento. Então, é preciso estar ciente de que o trabalho não acaba na delegacia e ter tudo documentado para não esquecer nenhum detalhe. Isso é essencial como prova, para que o réu seja condenado”, salientou o militar.

Com a preparação, os dois asseguram que, do total de pessoas presas por eles, pelo menos 98% resultaram em condenação na Justiça. “Uma vez que a gente levava o criminoso para a prisão, a gente sabia o crime que ele cometera e, com o material, o juiz conseguia entender o que de fato ocorrera no ambiente do flagrante”, frisou Santos

Chiovitti reforçou ser importante o levantamento também para manter na memória o que ocorre durante o momento do flagrante, até para evitar que a defesa dos criminosos tente algum tipo de manobra para converter a situação em processo contra o policial.

“Infelizmente, tem uma série de fatores que atrapalham o nosso trabalho contra o crime. Mas, eu imagino que nós temos que ser como água no rio: se tem uma pedra na frente, a água passa do lado, mas continua fluindo, essa é a nossa função”, enfatizou Chiovitti.

Mesmo com as dificuldades pontuadas, ambos afirmam que nunca pensaram em desistir ou mudar de profissão. “Colocamos essa farda para honrar, amar e levar com a gente até o final. Quando nossos filhos perguntarem o que fizemos para ter um mundo melhor, nós vamos elencar todo o nosso trabalho”, salientou Santos.

Chiovitti adicionou: “Trabalhar na PM é uma vocação, existe uma entrega por um bem maior, pela sociedade e para cumprir as leis do país – que muitas vezes nós não concordamos, mas somos uma instituição legalista e temos que fazer valer essas leis”.

Atualmente, os dois policiais foram transferidos para setores diferentes. Contudo, ainda atuam no combate à criminalidade. Chiovitti, como motorista do veículo oficial do comando da 2a Cia e Santos, na equipe do canil.

Os agentes contam que a separação não foi uma opção pessoal e que, mesmo não atuando juntos na mesma viatura, continuam ajudando um ao outro, principalmente na troca de informações sobre atuação do crime organizado.

“A gente esbarrou com pessoas poderosas, mexemos com quem ninguém mexia. Aí, chegou o momento que o melhor a se fazer foi separar a equipe e tomar outros rumos, mas ainda trabalhamos juntos. Se chega alguma informação para ele, ele passa para mim e vice-versa. Ainda temos a parceria”, destacou Santos.

Quanto ao apelido de Batman e Robin, os militares disseram ficar honrados. “Por mais que aconteçam certas coisas dentro da PM, referentes à criminalidade, como ameaças e tal, isso é uma forma de reconhecimento. E, com isso, a sensação é de dever cumprido”, finalizou Chiovitti.