Mais de dez moradias são atingidas por elevação em 5,5 m do Sorocaba

 

Entre a sexta-feira da semana passada, 20, e o domingo, 22, o rio Sorocaba subiu 5,5 metros acima do nível normal. A elevação – superior em 3,5 metros na comparação com a última medição divulgada por O Progresso – provocou alagamento em mais de dez residências localizadas no distrito de Americana.

Sete delas estão situadas em uma espécie de “residencial”, chamado pelos moradores de pesqueiro. A reportagem de O Progresso conversou com um dos proprietários do local, na manhã de quarta-feira, 25, quando o nível do rio começou a cair.

Pedro Carlos Bosso, 72, contou que os moradores não se surpreenderam com a enchente, apesar do desconforto. De acordo com ele, a inundação de algumas das propriedades já era esperada, uma vez que sempre há alagamentos em época de cheia. “Não encheu muito neste ano”, avaliou.

No ano passado, o bairro sofreu com maior volume de chuvas. Em 2016, o Sorocaba ficou 8,2 metros acima do nível normal, o que causou alagamentos em diversos pontos do bairro rural.

Casas consideradas distantes das chamadas áreas de várzea (que margeiam o Sorocaba e o rio Tatuí) tiveram inundações. A enchente obrigou famílias a deixarem as propriedades.

No pesqueiro, algumas das casas atingidas registravam resquícios da cheia até a manhã do dia 25. Os imóveis tinham águas represadas por conta de desnivelamento.

A maioria delas é usada como casa de veraneio (recebe os proprietários e convidados apenas aos finais de semana). Por conta da proximidade com o rio e a vulnerabilidade, os imóveis do local possuem mais de um piso (térreo e primeiro andar). A arquitetura previne eventuais danos com perda de móveis e eletroeletrônicos, no caso de inundações repentinas.

No bairro, as cheias são resultado da elevação do Sorocaba, que recebe águas do rio Sarapuí. Quando as chuvas são mais intensas nas cabeceiras dos dois rios, nos municípios de Sorocaba, Votorantim e Sarapuí, o Sorocaba sobe.

Com isso, o rio chega ao distrito de Americana “mais encorpado”. Quando há elevação considerável por conta das chuvas, o bairro sofre com efeitos distintos.

Apesar do controle da vazão feito pela barragem da Usina Hidrelétrica Santa Adélia, acima de dois metros do nível normal, o rio começa a invadir quintais das casas ribeirinhas situadas na rua Maria Conceição Martins. Além disso, o Sorocaba atinge os imóveis do residencial por conta do chamado refluxo.

A área na qual estão construídas as propriedades fica a metros de distância do encontro do Sorocaba com o rio Tatuí. A confluência ocorre num ponto no qual o Tatuí faz uma curva em formato de “S”. Quando os dois rios estão cheios, este último – por ter menos volume – passa a invadir boa parte da mata ciliar.

“Perto daqui, ainda temos um ‘buraco’, no qual o rio fica represado e volta para trás. Aí, quando o Sorocaba aumenta, começa a encher tudo por aqui”, disse Bosso.

O aposentado contou que passara a infância no bairro, tendo, portanto, testemunhado várias enchentes. Duas delas, pelo menos, registradas com marcas em uma das colunas da entrada do residencial. Bosso marcou, com riscos no pilar do portão de abertura, a altura das cheias de 2008 e 2016.

“Aqui, dá cheia porque é igual a São Paulo. A capital foi crescendo, ficou grande e é o mesmo que acontece aqui, quando chove muito”, atestou o aposentado.

Bosso disse, ainda, que um grupo de moradores chegou a auxiliar a Defesa Civil do município no trabalho de encontrar solução para a enchente. “Resolver não dá, mas é possível reduzir com uma ação simples”, argumentou.

Bosso defendeu proposta que havia sido apresentada pela coordenadoria da Defesa Civil de Tatuí em janeiro de 2011, mas abortada um ano depois. Trata-se do “corta-rios”, que consistia em uma abertura de passagem sete metros antes do encontro dos rios Sorocaba e Tatuí, para evitar o refluxo.

O morador alegou que a abertura funcionaria como um sifão utilizado em pias. Segundo ele, ao invés de segurar o mau cheiro, como nas pias, esse “sifão” seguraria a água para que ela não invadisse a região onde ficam as propriedades.

Bosso contou que chegara a medir a extensão da possível abertura entre os rios, na ocasião, a pedido da DC. Com a ajuda de um amigo e utilizando bambus e trena, ele mediu a distância do trecho a ser escavado para permitir o escoamento. “Deu 28,90 metros de uma extremidade do bambu à outra”, contou.

A DC anunciou o engavetamento do projeto em janeiro de 2012, após técnicos do órgão chegarem a consenso de que seria melhor abandoná-lo. O plano com o “corta-rios” era amenizar os alagamentos no distrito de Americana, recorrentes no período chuvoso (entre os meses de dezembro e março).

A ideia de construir uma espécie de “ladrão” de água não se sustentou. Na época, a Defesa Civil informou que a resolução em arquivar a ideia veio de consulta junto a “vários profissionais”. Eles teriam alertado para as dificuldades na obtenção da aprovação de autorizações de órgãos ambientais.

O projeto havia sido sugerido por Zacharias Nunes Rolim, que ocupou o cargo de secretário municipal da Agricultura. A DC chegou a encaminhá-lo a representantes de outros órgãos ambientais. Entretanto, havia sido informado que a proposta dificilmente seria aprovada.

O projeto técnico apresentado pelo órgão – e divulgado por O Progresso – previa que o “corta-rios” fosse implantado um metro acima do nível do Tatuí, com o intuito de “evitar a mudança do caminho natural do rio”.

A medida tinha o intuito de facilitar a aprovação da proposta pelos órgãos de proteção ao meio ambiente, o que não ocorreu. No entendimento de técnicos, o projeto mudaria o curso natural do rio Tatuí, que desemboca no Sorocaba. O “corta-rios”, na prática, alteraria o ponto em que os dois rios se cruzam.

Sem essa possibilidade, as autoridades fazem o “controle” do nível do rio Sorocaba por meio de colaboração. Contam com o apoio de funcionários da hidrelétrica.

A represa fica responsável por aumentar ou reduzir a vazão com base no volume de água que recebe e nas recomendações da coordenadoria regional da Defesa Civil, em consonância com equipes de Tatuí e Boituva.

“No fim de semana passado, registramos uma subida das águas, principalmente, por conta do rio Sarapuí. Mas, mantemos o controle da vazão”, explicou o gerente da Companhia Energética de Tatuí, Carlos Eduardo de Oliveira.

De acordo com ele, o coordenador regional da DC, major Miguel Ângelo de Campos, discute com os profissionais qual a melhor ação a ser adotada. A meta é permitir que o volume de água cause menos transtornos aos ribeirinhos.

“Nós definimos qual é a melhor possibilidade, se segurar ou deixar escoar o máximo possível de água de acordo com relatórios que recebemos”, contou o gerente.

Até o dia 25, para garantir a vazão, a usina mantinha duas comportas e meia (das 11) fechadas parcialmente. As demais vertiam água “pelo fundo” (acima).

A vazão também se deu pelo chamado “vertedouro”. Trata-se de estrutura hidráulica que pode ser utilizada para várias finalidades. As duas consideradas principais são a medição e o controle de vazão.

Desde a elevação do rio, a usina tem liberado a vazão, o que permitiu, no dia 25, a redução de três centímetros por hora. “Provavelmente, se não chover muito nas cabeceiras nos próximos dias, o rio volta ao normal”, observou Oliveira. Caso contrário, a previsão é de que a enchente fique ainda mais severa.