Da reportagem
A Justiça de Tatuí, por meio da Vara do Juizado Especial Cível e Criminal e do Núcleo de Justiça Restaurativa, está participando de projeto de desenvolvimento de ventiladores pulmonares para ajudar no enfrentamento à pandemia de Covid-19.
O projeto surgiu de proposta do juiz da JEC e coordenador da JR, Marcelo Nalesso Salmaso, que procurou a Fatec (Faculdade de Tecnologia) “Professor Wilson Roberto Ribeiro de Camargo” para uma parceria no desenvolvimento de equipamentos de baixo custo e posterior produção.
De acordo com Salmaso, a iniciativa surgiu quando ele soube do alto custo dos aparelhos existentes no mercado, da falta de equipamentos por conta da procura e da necessidade da ventilação pulmonar para ajudar no tratamento dos pacientes graves, contaminados pela Covid-19.
“Quando me deparei com os valores dos equipamentos oferecidos no mercado, me assustei e vi que os recursos não seriam suficientes. A partir disso, comecei a pensar em uma solução e me ocorreu a proposta de parceria com a Fatec”, contou o juiz.
Ele frisou que a faculdade estadual sempre foi parceira da Justiça Restaurativa e, inclusive, mantém um projeto de reaproveitamento e destinação das máquinas caça-níqueis apreendidas.
“Além disso, a instituição conta com uma expertise muito grande de professores e alunos em termos de tecnologia. Comecei um diálogo com eles e, depois, isso foi formalizado em ofício”, adicionou o juiz.
Segundo Salmaso, professores e alunos aceitaram a proposta, outras instituições públicas e privadas abraçaram a causa e o resultado foi um protótipo de ventilador que segue as regulamentações técnicas da ABNT e as normativas internacionais (reportagem nesta edição).
“A partir deste movimento, os professores e alunos desenvolveram o projeto, construíram um protótipo de bancada – que foi testado com sucesso e, agora, vamos começar os testes clínicos, em instituições de saúde, com pulmões artificiais para, depois, passar por testes formais”, detalhou o juiz.
Salmaso ressaltou ter acompanhado e incentivado todo o processo, desde os primeiros passos da criação do aparelho. Segundo ele, toda a ação está sendo documentada para, posteriormente, ser apresentada à Corregedoria-Geral do Estado e à presidência do Tribunal de Justiça.
“Depois que começamos, outros parceiros se juntaram e nós participamos de todas as reuniões para mostrarmos que era um projeto sério, com uma instituição de ensino de prestígio e também o Poder Judiciário”, contou o magistrado.
Conforme Salmaso, o incentivo da Justiça ao projeto também será no sentido financeiro. O primeiro protótipo foi custeado por doações dos alunos e professores, contudo, outros cinco serão construídos para uma segunda fase de testes, e parte deles será custeada com valores do fundo das penas pecuniárias da comarca.
“Estamos levantando os custos e é muito provável que, depois do registro na Anvisa, uma parte do valor do fundo também seja destinada à fabricação de alguns equipamentos às secretarias de saúde da região, mas ainda estamos analisando”, antecipou o juiz.
“A nossa proposta para as empresas parceiras, que vão produzir os equipamentos, é de que elas forneçam uma cota, a preço de custo, às cidades envolvidas no projeto. A empresa leva o projeto pronto, mas não lucra com essa cota, que nós vamos estabelecer para atender a região”, explicou o magistrado.
Salmaso revelou ter uma estimativa inicial de gastos em torno de R$ 40 mil para a fase de produção dos protótipos e testes. “Depois que fizermos as estimativas finais e for apresentado o projeto para captação de recursos do fundo, vou abrir vista para o parecer do Ministério Público e depois decidir pela liberação do recurso”, completou Salmaso.
Penas pecuniárias
Salmaso explicou que as penas pecuniárias são alternativas às penas privativas de liberdade, podendo ser aplicadas em determinadas hipóteses previstas por lei – a depender da pena e da natureza do crime.
Nesses casos, o juiz, ao sentenciar, aplica a pena alternativa e fixa o valor. A prestação pecuniária pode ser fixada na transação penal, na suspensão condicional do processo e no acordo de não persecução penal.
“Antes, o valor das multas era destinado diretamente para as entidades, mas, agora, ele vai para o fundo de penas de prestações pecuniárias e as instituições têm que apresentar projetos para poder receber. Se tudo estiver dentro das normas exigidas e tiver o recurso, o valor é liberado e a Justiça acompanha a execução”, completou o juiz.
Todas as regras e exigências para que as entidades e projetos sociais possam captar o recurso do fundo de penas de prestações pecuniárias estão especificadas no provimento 35/2017 da Corregedoria-Geral do Estado de São Paulo.
“Depois que é liberado o recurso, a instituição tem um prazo para utilizar, e, no fim deste prazo, a entidade precisa prestar contas à Justiça – que acompanha toda a execução do projeto -, trazer todas as notas fiscais, fotografias do que fez e comprovar como foi usado o recurso”, explicou o magistrado.
Esta é a segunda vez neste ano que o Poder Judiciário destina recursos oriundos do fundo para o enfrentamento à pandemia. Em abril, atendendo a requerimento do Ministério Público, as varas do Juizado Especial Civil e Criminal e de Execuções Criminais destinaram R$ 364 mil à compra de equipamentos e insumos para a Saúde.
Em outras ocasiões, o fundo já serviu para reformas em instituições como a Casa de Apoio ao Irmão de Rua “São José”, Lar Donato Flores, Apae e Casa do Bom Menino. Também estão previstos recursos do fundo para ajudar na construção do Centro Integrado de Reabilitação (CIR) e da Clínica-Escola para Autistas.
Conforme a assessoria de comunicação do Tribunal de Justiça de São Paulo, os tribunais de todo o estado já destinaram mais de R$ 12 milhões para o combate à Covid-19, em valores arrecadados com as penas pecuniárias.
Em cada comarca, juízes destinaram as quantias que estavam nas contas judiciais para a aquisição de equipamentos, medicamentos e insumos.
“Aqui, as instituições, o Poder Judiciário, a Fatec e a sociedade civil se uniram para um projeto comum, que beneficia toda a população. Todos assumiram a sua responsabilidade consigo, com as outras pessoas e com a sociedade como um todo”, concluiu o juiz.