Justiça condena ‘chefe’ do tráfico no Jd. Rosa Garcia 2 a 27 anos de prisão

Julgamentos aconteceram no fórum da comarca e começaram em fevereiro, terminando no mês de março (foto: arquivo O Progresso)

A Justiça condenou, no dia 31 do mês passado, 14 de 18 pessoas acusadas de envolvimento com o tráfico de drogas na região do Jardim Rosa Garcia 2. Uma 15ª, uma policial civil, teve condenação por corrupção passiva.

O réu Ronaldo Rodrigues de Moura, conhecido como “Ná” e apontado como chefe da quadrilha, teve a maior pena, de 27 anos, 1 mês e 10 dias de reclusão. O processo é decorrente de investigações que começaram no ano de 2014.

Segundo a Justiça, a quadrilha teria laços com a facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital). Alguns dos réus apontados como integrantes do grupo trabalhavam na Prefeitura e atuariam como “lobistas” junto à administração anterior.

Entre os condenados, estão Bruno Henrique Feliz Nogueira (18 anos de prisão), Bruno Henrique Vieira Costa (dez anos de pena), o ex-policial militar Cleber Roberto Sales (quase 12 anos de detenção), o ex-funcionário público Jeferson de Camargo (quatro anos e oito meses), Jéssica Aparecida de Góes de Lima (quatro anos e oito meses) e Thais Daniele Aparecida Nogueira (três anos e dez meses de prisão).

Ainda foram condenados Wellington Batista de Queiroz (três anos e dez meses de reclusão), Douglas Aparecido Vieira (cinco anos e cinco meses de prisão), Israel Augusto de Oliveira (quatro anos e oito meses), Reginaldo de Oliveira (seis anos e nove meses) e Emerson Ribeiro da Silva (cinco anos e cinco meses).

Os advogados Sílvia Regina Catto Mocellin, ex-presidente da subseção tatuiana da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), e Ari Antonio Domingues receberam pena de cinco anos e cinco meses de reclusão, em regime semiaberto.

A escrivã da Polícia Civil Adriana de Camargo recebeu a pena de dois anos e oito meses de reclusão, em regime inicial semiaberto. A juíza responsável pelo processo determinou a perda do cargo público, em função do crime de corrupção passiva.

O grupo foi preso após uma sequência de interceptações telefônicas realizadas pela Polícia Civil com autorização judicial. Nelas, os réus são flagrados combinando ações do crime organizado e intermediando conversas com integrantes do Executivo local, conforme sentença da juíza Mariana Teixeira Salviano da Rocha, da 1ª Vara Criminal de Tatuí.

“Assim sendo, é certo que o vínculo entre a base da pirâmide e o núcleo de comando se deu em virtude do teor das interceptações telefônicas, aliado ao conjunto probatório amealhado, notadamente por diversos depoimentos prestados por policiais militares e guardas civis”, consta-se nos autos.

De acordo com a magistrada, a quadrilha, “maior verificada até o presente momento na cidade”, teria três núcleos principais: o “comando”, formado pelos chefes do tráfico de drogas no Jardim Rosa Garcia 2; o “jurídico”, integrado por dois advogados; e o “de atuação junto à Prefeitura”.

Outros integrantes da organização foram apontados como sendo da “base da pirâmide”, ou seja, distribuidores que atuavam no trabalho de campo.

Em uma das ligações transcritas no processo judicial, Sales, que trabalhava na Prefeitura na época e era ex-policial militar, pede a entrega de relatório contendo todos os boletins de ocorrências registrados no Jardim Rosa Garcia 2 e promete que o favor “vai ser muito bem gratificado”.

De acordo com o processo, os dois advogados condenados seriam contratados pelo comando da organização criminosa. Ao atuarem em todas as prisões que envolviam distribuidores de drogas da quadrilha, os defensores impediriam que os presos mencionassem algum envolvimento com a quadrilha que comercializava drogas na região do Rosa Garcia 2.

Em uma das interceptações, realizadas em 25 de fevereiro do ano passado, os advogados mostram preocupação de que uma menina presa com drogas “fale quem é seu patrão”.

Policiais civis também interceptaram, em 23 de dezembro de 2015, uma conversa entre a advogada Sílvia e a esposa de Ná.

Na gravação, a defensora diz para “ficar tudo tranquilo”, pois uma pessoa presa por tráfico de drogas dissera, em depoimento no plantão policial, que “não sabia de nada” e assumira a posse dos entorpecentes apreendidos.

Na decisão, a juíza afirma ter constatado que os advogados atuaram em ocorrências policiais “por determinação do núcleo de comando, sempre no único intuito de preservar a organização”.

Um dos ramos da quadrilha atuava juntamente à Prefeitura. De acordo com a juíza, a intenção do comando da organização era estabelecer contato com o poder municipal com a “finalidade precípua de inibir a atuação de forças de segurança pública” na região dominada pelo grupo.

Apesar de a intenção da quadrilha ter ficado evidente nas ligações grampeadas pela Polícia Civil, não se pode constatar se, “efetivamente, houve essa inibição da atuação da GCM (Guarda Civil Municipal)”, sustenta a juíza.

A assessoria de comunicação da Prefeitura emitiu nota à imprensa comentando a respeito da condenação dos ex-funcionários públicos municipais citados no processo.

Sobre um deles, o ex-policial militar que trabalhava como motorista, a informação oficial é de que o condenado foi contratado como prático de poda, tendo trabalhado de junho de 2015 a abril de 2016.

“Segundo informou o RH (recursos humanos), nunca exerceu a função, tendo sido lotado no gabinete do então prefeito José Manoel Correa Coelho, como motorista e segurança”.

Procurado, o ex-prefeito se manifestou por meio de nota, dizendo não ter conhecimento, tampouco contato, com as pessoas condenadas, não sendo citado pela Justiça. Manu afirmou que exonerara “imediatamente o funcionário envolvido no caso”.

“Em meu governo, o comando e a Guarda Civil Municipal de Tatuí sempre trabalharam com autonomia, sendo severos e intolerantes contra os crimes, abrangendo todos os bairros da cidade”, divulgou.

O ex-prefeito informou não ter trocado o comando da GCM “nem antes e nem depois desses fatos” e mantido a direção da corporação até o final do mandato.

A reportagem procurou os advogados dos réus. Mateus Soares, representante de Bruno Henrique Vieira Costa, Jéssica Aparecida Góes de Lima e Thaís Daniele Aparecida Nogueira disse acreditar na inocência dos sentenciados. O defensor antecipou já ter protocolado a apelação dos três representados.

A advogada Rosângela Aparecida Xisto Soares afirmou que entrará com recurso, mas disse preferir não comentar sobre o caso. Os outros representantes dos réus não foram encontrados para comentarem a ação criminal.

Procurada, a policial civil mencionou que a sentença não é definitiva e que irá recorrer, uma vez que, embora tenha havido pedido de pesquisa para ela, este partira de pessoas do Poder Executivo.

O pedido a ela, reforçou, foi feito por Cleber Sales, “não tendo havido, durante esse pedido, nenhuma menção a qualquer tipo de criminoso, sendo que estes fatos foram, inclusive, comprovados através de laudo pericial juntado aos autos”.

A operação

As investigações que culminaram na prisão e no julgamento dos envolvidos com a organização criminosa tiveram início no final de 2015.

Em março de 2016, uma megaoperação foi deflagrada e culminou com a prisão de oito pessoas, duas delas no município de Caraguatatuba. Depois, outros envolvidos com a quadrilha foram presos por policiais civis.

Participaram da ação, aproximadamente, 40 agentes. Policiais da Dise (Delegacia de Investigações Sobre Entorpecentes), da DIG (Delegacia de Investigações Gerais) e de distritos policiais de Itapetininga também acompanharam as prisões. Eles prestaram apoio à equipe da Polícia Civil de Tatuí.

Em fevereiro deste ano, a Justiça começou o julgamento dos integrantes da quadrilha. Foram ouvidas, no total, 46 pessoas, entre réus, testemunhas de defesa e acusação.

Na acusação, foram ouvidos delegados, investigadores, guardas civis municipais, policiais militares, funcionários públicos e escrivães.

Outras seis pessoas prestaram depoimentos por carta precatória. Elas são das cidades de Itu, Mairinque, Campinas e Franco da Rocha.

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