Fato ou fake

E teve início a campanha eleitoral – oficialmente, claro -, na qual Tatuí apresenta algumas candidaturas “locais”, digamos. Pessoas que, residentes na cidade, com vida familiar e profissional aqui estabelecida, naturalmente vêm a ser as opções mais lógicas para ganhar os votos dos tatuianos.

Por óbvio motivo de isenção e em respeito ao direito de livre escolha do eleitor, não cabe aqui questionamentos quanto às chances de vitória e méritos públicos de cada um. Não obstante, vale a observação de que, a princípio, existe um temor em comum a todos: a tão trombeteada “fake news”.

Sim, é muito antiga essa coisa de inventar e manipular histórias, na política, para prejudicar os adversários. A novidade é a intensidade e abrangência com que isto ocorre na atualidade, graças às redes sociais.

Por certo, também, é o caso de que a manipulação só interessa a quem já parte mal-intencionado para a disputa, a quem não possui, efetivamente, nenhuma boa intenção como figura pública, já demonstrando o “modus-operandi” criminoso na própria campanha.

Fosse fácil perceber as mentiras e manipulações, portanto, as fake news seriam ótimas, justamente porque permitiriam aos eleitores em busca dos melhores candidatos o descarte dos piores, tomando por base o descompromisso destes com os “fatos”, evidentes por seus “fakes”.

No entanto, por mais que muitos digam o contrário, não é tão simples perceber o que é fato e o que é fake, até porque, em muitas situações, a suposta notícia compartilhada não é nem uma coisa e nem outra: trata-se do tal “não é bem assim”.

Isto ocorre, por exemplo, quando se comenta ou compartilha algo a partir (somente) da observação de títulos de notícias verdadeiras. Então, evidencia-se a responsabilidade do eleitor, do cidadão – ou, de outra forma, a irresponsabilidade do indivíduo preguiçoso (e presunçoso), que só lê uma chamada e já sai sentenciado tudo e todos com sua polidez de dragão de Komodo e cabedal de ignorâncias.

Com tantas incertezas, a consequência menos insuspeita é a de que as redes sociais caíram por completo em descrédito como veículos de informação – algo diferente de veículos de comunicação, ressalte-se.

As redes são excelentes e irreversíveis para a comunicação – global, inclusive -, mas péssimas para a informação, ao menos as de confiança e credibilidade.

Por este motivo, muitos veículos reais de “informação” – tal como os políticos bem-intencionados – estão se mobilizando para enfrentar as fake news nestas eleições. O principal grupo de comunicação do país, a Globo, acaba de lançar campanha a respeito.

A ação divulga que “enfrentar a disseminação de informações falsas é um desafio em uma sociedade na qual bastam uma conexão de internet e um clique para compartilhar notícias, mensagens, vídeos e fotos. Entre centenas de conteúdos que recebemos diariamente, das mais diversas fontes, como identificar o que é verdade?”.

O projeto “Fato ou Fake”, segundo o grupo, deve conferir e esclarecer o que é real (fato) e o que é falso (fake). Jornalistas dos oito veículos da empresa farão monitoramento diário para identificar postagens e mensagens muito compartilhadas em redes sociais e por aplicativos como o WhatsApp.

“Todos os veículos envolvidos poderão exibir, publicar ou transmitir matérias com o conteúdo das checagens feitas em conjunto”, explica a campanha.

“Para confrontar versões e impedir a difusão de rumores, serão conferidos selos de ‘Fato’, ‘Fake’ ou ‘Não é Bem Assim’ às mensagens e declarações.

Haverá ainda um ‘bot’ (robô) no Facebook e no Twitter à disposição do público para responder se uma informação é fato ou fake, caso esta já tenha sido checada pelos jornalistas do projeto”.

Basicamente, a proposta é classificar as notícias, para o público, como qualquer veículo de informação em geral e os jornalistas em particular o devem fazer.

Ou seja: “fato”, quando a informação checada é totalmente verídica e comprovada por meio de dados, datas, locais, pessoas envolvidas, fontes oficiais e especialistas; “fake”, quando a informação não se baseia em fatos comprovados pelos mesmos meios e fontes; e “não é bem assim”, quando a informação é parcialmente verdadeira, exagerada ou incompleta, e exige esclarecimento ou maior contextualização para ser totalmente compreendida.

Antes, já havia sido lançada a campanha “Duvide”, por meio de filmes para a TV, anúncios impressos e spots de rádio, com um convite: antes de compartilhar com amigos e familiares, questione as informações que recebe.

Nos filmes, os efeitos manada e dominó, representados graficamente, mostram a propagação de uma história, só interrompida por alguém consciente, que decide “duvidar”.

O ruído na comunicação, tão típico das fake news, também é simbolizado em filme por linhas com efeitos de áudio, que se rompem depois que alguém duvida. Um grande ponto de interrogação surge no final, seguido pelo chamado: “Não Deixe o Fake Virar News”, assinatura de todas as peças.

“O compromisso com a verdade e o papel dos veículos de comunicação na mudança de comportamento da sociedade levam ao segundo momento da campanha”, ressalta a ação.

‘O objetivo é valorizar o jornalismo e mostrar como a profissão está a serviço de quem duvida, impedindo que notícias falsas virem notícia”.

O novo filme destaca as pesquisas de campo, o dia a dia da apuração jornalística, a investigação e todo esforço em busca do fato. As demais peças da campanha mostram a perigosa cadeia das fake news, com análises sobre assuntos que viralizam, movimentam as redes sociais e podem até destruir vidas.

Em outra dimensão, bem mais modesta, Tatuí não terá selos em seus noticiários locais. Contudo, enfrenta a mesma realidade, sujeita às manipulações.

Daí a responsabilidade de se observar com atenção, ponderar e, especialmente, duvidar do que se compartilha – senão para salvar vidas, ao menos para não se deixar enganar.