‘Contratação de deficientes não se dá por falta de acesso’, diz Apodet





Amanda Mageste

Quarenta e cinco pessoas com deficiência foram contratadas e estão trabalhando com auxílio da Apodet

 

Por falta de condições de acessibilidade, empresas de Tatuí limitam a contratação de pessoas com deficiência. A afirmação é da presidente da Apodet (Associação dos Portadores de Deficiência de Tatuí), Solange Sales Abude. Conforme ela, no geral, as empresas contratam pessoas com “pouca deficiência”.

Em entrevista a O Progresso, a presidente comentou sobre o processo de contratação de deficientes, que ganharam 92 vagas na região de Sorocaba, por meio do “Emprega São Paulo”. O programa do governo do Estado apontou que quatro delas estavam sendo oferecidas na cidade, no final do mês passado.

Além do programa, Solange informou que os deficientes estão sendo contratados diretamente pelas empresas “de grande porte” de Tatuí. Segundo ela, há muitas vagas abertas no município, por conta da “lei de cotas”. Ela exige que os deficientes sejam admitidos com base no número de funcionários.

Proporcionalmente, empresas que tenham entre cem a 200 funcionários devem preencher 2% dos cargos com deficientes; de 201 a 500, a porcentagem sobe para 3%; de 501 a 1.000, é 4%; e de 1.001 em diante, são necessários 5%.

A presidente da Apodet considera a lei muito importante, mas afirmou que não “vê que a contratação está ligada somente à responsabilidade social”. Também conforme ela, no geral, são contratadas pessoas com deficiências menos severas.

“O que as empresas querem é o congênito, que é aquele que nasceu com uma deficiência e não vai tomar remédio, porque a deficiência veio com ele”, declarou. A explicação é que a deficiência “de nascença” não traria “novos agravantes”.

“Até eu tenho falado com as empresas. Eu insisto muito. Mas eles (empresários) não têm condições de pegar, e nem querem. Eles acabam limitando. Querem gente que não tenha um dedo, por exemplo”, salientou Solange.

De acordo com ela, essa limitação por parte de empresas para contratar deficientes acontece por falta de condições de acessibilidade. O problema maior é que as contratantes querem evitar o custo para adaptações que, muitas vezes, é alto.

A presidente contou que há pouca procura por parte de empresários a deficientes que necessitam de mais acessibilidade, como os cegos, por exemplo. Solange desenvolve ações em empresas para mostrar o que seria necessário melhorar e adaptar, caso o local necessite contratar um deficiente.

O trabalho consiste na montagem de um posto na empresa que solicitar a admissão de deficientes. No espaço, a Apodet projeta quais mudanças seriam necessárias para que a pessoa com limitação pudesse trabalhar tranquilamente.

“Faço um mapeamento da acessibilidade. Vejo se a empresa tem condições de receber aquele deficiente. Onde que ela vai querer colocar aquela pessoa para trabalhar, qual tipo de trabalho que ela vai exercer. Dentro disso a gente vai ver qual a condição e tipo de funcionário pode colocar”, afirmou a presidente.

Conforme ela, a falta de acessibilidade é o maior problema encontrado dentro das empresas de Tatuí. Solange salientou que não é possível colocar um cadeirante ou um deficiente visual para trabalhar dentro de um local que não segue as normas de acessibilidade. Isso dificulta a inclusão no mercado de trabalho.

A presidente afirmou, ainda, que os deficientes visuais são os que menos conseguem espaço. O motivo principal é a famigerada falta de acessibilidade.

Mercado de trabalho

Além de ações de apoio, a Apodet tem como meta preparar os deficientes para o mercado de trabalho. De acordo com a presidente da entidade, esse trabalho é difícil, porque depende das dificuldades que cada eficiente vai enfrentar.

Por conta disso, a entidade realiza um trabalho de preparação junto aos deficientes. A ação agrega desde cursos dentro da instituição até aulas de mobilidade e orientações, que podem ser feitas nas ruas, com orientação de uma professora.

Conforme Solange, o número de deficientes que buscam serviço no município é alto. Entretanto, eles encontram dificuldades por conta das condições do ambiente de trabalho e dos custos que uma adaptação pode implicar para as empresas. “O problema é o mercado”, analisou a presidente.

Segundo ela, o público que frequenta a Apodet está preparado e treinado. O contraste é que as empresas que oferecem as vagas “ainda não conseguem recebê-las”.

Na entidade, os cegos ou pessoas com pouca visão fazem aula de informática. O curso é oferecido gratuitamente, utilizando um programa específico, sendo considerado preparatório para vagas na área de recursos humanos.

“O professor de informática é deficiente visual, mas ele dá aulas, o que mostra como é a capacitação que é oferecida para um deficiente visual aqui. As pessoas são instruídas e estão prontas para trabalhar”, enfatizou Solange.

Por conta do trabalho da associação, 45 pessoas com deficiência obtiveram emprego. Os números foram apresentados pela assistente social da Apodet, Kelly Bárbara Moreira Gonçalves. De acordo com ela, porém, nenhuma é deficiente visual.

Vanessa Junia, professora de orientação e mobilidade da associação, ajuda a preparar os deficientes para entrada no mercado de trabalho. Segundo ela, a maior dificuldade não está relacionada com os encaminhados, mas com as empresas.

“Temos bastante procura por causa de lei de cotas, mas as empresas querem coisas muito fáceis. Só querem o deficiente e pronto, acabou. Não querem adequar”, afirmou.

A professora garante que os deficientes possuem capacidade de render e trabalhar como “qualquer outra pessoa”. Ela afirmou, ainda, que se houver treinamento e disposição da empresa e do contratado, o trabalho será “bom para ambas as partes”.

Área visada

Recursos humanos é área em que a presidente, a professora e a assistente social da Apodet acreditam que os deficientes visuais possam oferecer mais benefícios às empresas. O motivo é que eles já têm contato com o trabalho na entidade.

O professor de informática e Braile (sistema de leitura para cegos que usa o tato), Nilson dos Santos Ribeiro, disse que possui vários amigos deficientes visuais que estão procurando emprego. Contudo, a maioria não consegue encontrar.

Ribeiro acredita que o governo federal precisará realizar uma mudança na lei de cotas, para que os deficientes visuais possam encontrar emprego. Caso haja mudança, eles poderão se desvencilhar dos benefícios assistenciais.

De acordo com o professor, há pessoas com deficiência visual que fazem protestos e exigem mudanças na lei de cotas. Ribeiro afirmou, ainda, que a proporção para que empresas contratem deficientes deveria sofrer alteração.

Conforme ele, seria interessante que dentro da proporção houvesse uma divisão para contratação de deficientes visuais, auditivos, físicos e intelectuais. “Vai ter que separar. Você coloca 5% para todas as deficiências, só que eles não pegam, pegam só o físico e mental leve”, acrescentou.

Hugo Danrley Costa dos Santos, 18, é deficiente intelectual e conseguiu um trabalho há 11 meses, por meio da Apodet, em uma farmácia. Ele afirmou que no começo encontrou dificuldades de adaptação, mas conseguiu evoluir.

“Agora, está mais sossegado, sei mexer no computador, estou mais tranquilo. Antes, ficava só trabalhando como repositor. Agora, já fico no balcão”, contou o jovem.

Santos afirmou que não pretende parar de trabalhar para procurar qualquer auxílio do governo. Ele disse que só vai parar “quando se aposentar ou morrer”.

O jovem tem deficiência classificada como “leve”. Ele apresenta dificuldades em ler e escrever, mas disposição para aprender. Conforme Santos, a família dele demorou a descobrir a deficiência. O frequentador da Apodet disse que, consequentemente, houve um atraso na procura por ajuda.

Além de estudar e trabalhar, Santos é atleta e representa a cidade em competições na região. O jovem compete na categoria PCD (pessoa com deficiência).

Dificuldade

Outro ponto que dificulta a contratação de deficientes em empresas é o benefício assistencial ao deficiente, conforme a presidente da associação. O governo federal disponibiliza assistência às pessoas que comprovem que não possuem condições de trabalhar.

De acordo com Solange, alguns deficientes recebem auxílio e, por isso, decidem não trabalhar. “Não porque não querem, é porque eles sentem na pele, porque é um preconceito imenso sobre um trabalhador deficiente”, afirmou.

Além disso, a presidente acredita que as empresas, para não melhorar acessibilidade, limitam a empregabilidade de deficientes. Conforme Solange, elas contratam pessoas que possuem mais condições de mobilidade.

Vagas da Sert

Para ter acesso às vagas divulgadas pela Sert (Secretaria Estadual do Emprego e Relações do Trabalho) basta acessar o site www.empregasaopaulo.sp.gov.br, criar “login”, senha e informar dados solicitados.

Outra opção é comparecer ao PAT (Posto de Atendimento ao Trabalhador), situado à rua Coronel Aureliano de Camargo, 943, centro, com documentos pessoais. Em Tatuí, o PAT tem uma segunda unidade anexa ao Poupatempo, na avenida Coronel Firmo Vieira de Camargo, 135, também no centro.

O empregador que deseja contratar deficientes também pode efetuar cadastro no site do Emprega São Paulo ou PAT. O endereço é www.empregasaopaulo.sp.gov.br.