Oito anos depois de ter sido “extinto” por conta de proposta de consolidação de leis, o Conservatório Dramático e Musical “Dr. Carlos de Campos”, de Tatuí, voltou a existir legalmente. A Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo) aprovou no dia 19 projeto que restabelece a vigência da lei 997, de 13 de abril de 1951, que criou a instituição.
Apresentada pelo deputado estadual Samuel Moreira, a proposta faz retroagir os efeitos da lei 12.497, apresentada pelo então deputado estadual Cândido Vaccarezza (PT) que extingiu, aproximadamente, 13 mil itens da legislação considerados “ultrapassados”. Entre eles, a lei que deu origem ao CDMCC.
Em 2006, a Assembleia, votou favoravelmente pela proposta. Na época, Vaccarezza ocupava a função de presidente da Comissão de Consolidação das Leis do Estado. O então parlamentar havia divulgado nota por meio de assessoria jurídica na qual ele alegou que o fato “não fez com que a instituição deixasse de ter base legal”.
Vaccarezza alegou que “a norma jurídica que cria uma instituição, ao ser cumprida, já se efetiva plenamente, podendo ser revogada sem que cause qualquer prejuízo”. Pautados nesta interpretação legal, os funcionários especializados da Assembleia Legislativa teriam proposto a revogação da lei 997.
Na ocasião, o deputado argumentou que a interpretação havia sido aceita pelos demais deputados que faziam parte da Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia. “Vale ressaltar, a força vinculante da norma que criou o Conservatório não se alterou com a revogação e a obrigação de manter o Conservatório ainda existe”, constava-se no trecho final do comunicado.
A situação foi descoberta pelo diretor executivo da AACT (Associação dos Amigos do Conservatório de Tatuí), organização social responsável pela gerência da escola de música, luteria e artes cênicas, Henrique Autran Dourado, em janeiro de 2011. No mesmo ano, ele havia considerado o fato “gravíssimo”.
A assessoria do PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira) confirmou a restauração da legislação. Em nota, o partido informou que a situação havia trazido “sério desconforto à direção da escola de música tatuiana que, há quase uma década, tentava reverter este quadro”.
Também conforme a assessoria do partido, novos projetos estariam ameaçados de não acontecer se a situação não fosse revertida com urgência.
Esse panorama havia sido divulgado à legenda pelo diretor executivo da instituição em encontro com o presidente da Alesp, o deputado Samuel Moreira, e do diretório local do partido, o ex-prefeito Luiz Gonzaga Vieira de Camargo. Os dois participaram de reunião com Dourado no mês de setembro.
Via assessoria, Gonzaga disse que junto com Moreira e a bancada de vereadores locais do PSDB, DEM e PPL, ele assumiu o compromisso de “reverter a situação e aprovar o projeto de lei que restabelece a história e o esforço dos antepassados na criação da primeira escola de música estadual com ensino de alto nível e gratuito”.
“Conseguimos reparar este erro e honrar este compromisso e agradeço ao Samuel, presidente da Assembleia, os seus esforços para aprovar ainda em 2014 este projeto de lei, que tramita desde 2011 no Parlamento Paulista”, disse Gonzaga.
Dourado disse que a restituição da lei tem vários aspectos. Vai desde a questão simbólica até a de segurança. “Imagine que você contrata um serviço e ele, por alguma razão, termina. No caso de se interromper, por exemplo, a organização social que administra o Conservatório – o que não vai acontecer, mas vamos supor que aconteça – ele deixaria de existir”, explicou.
Nesse caso, o governo teria de criar uma nova lei para oficializar a instituição. Até que isso acontecesse, Dourado afirmou que “tudo poderia ser interrompido”. “A existência legal é fundamental. Como acontece com a Pinacoteca, que tem uma organização constituída e que começou em 1998”, contou.
Como perderia a rubrica do Estado, o Conservatório deixaria de existir. A razão é que ele não poderia receber diretamente dinheiro vindo do governo para ser mantido.
Além desse aspecto, Dourado disse que a lei tem “muitos outros efeitos”. Dentre eles, está a ajuda para alunos estrangeiros na concessão de visto de estudo. Conforme o diretor, o governo exige que a escola comprove que existe oficialmente para que o processo de emissão do visto possa ser analisado.
Dourado afirmou que solicitou a interferência de Moreira porque estava “preocupadíssimo”. Também disse que a restituição da lei original que criou o Conservatório dá garantias de que a instituição não corre o risco de ser extinta.
“Ele continua e continuará. O que garante isso é essa lei. Tivemos essa grata surpresa para fechar os 60 anos do Conservatório. Ele voltou à legalidade”, disse.
Para a instituição, o fato é tão importante que deve ganhar um novo marco. A diretoria estuda a instalação de uma nova placa em homenagem “à lei refeita”. O Conservatório já mantém uma placa com o nome do deputado Narciso Pieroni, autor da lei de fundação do Conservatório, criado em 1951 e instalado em 1954.
“Aos 60 anos, nós revigoramos a lei de fundação. É algo que dá uma segurança e mostra o que não deve acontecer. Menos, ainda, no Estado de São Paulo”, falou.
No entendimento do diretor executivo, a lei “revigorada” evita que “aventureiros que não gostem de música” queiram interromper o trabalho de seis décadas. “Isso é fundamental. Saber que nós existimos em virtude de uma lei. Esse é um presente de Natal para a cidade que não tem tamanho”.
Legalizado, o Conservatório de Tatuí poderá vislumbrar novos horizontes, como pedidos de verbas a serem recebidas diretamente pela instituição. Até então, os recursos só eram captados por meio da AACT em nome da escola de música.
“Foi uma grande batalha. Quando descobri da extinção fiquei muito preocupado. Tiro esse peso na semana que Tatuí assistiu a um concerto maravilhoso, de Angelica de la Riva, na Igreja Matriz”, concluiu o diretor executivo.