Da reportagem
O Conservatório de Tatuí contará com obras dos artistas visuais Denilson Baniwa, responsável por pintar quatro faces de empenas do prédio da Unidade 2, e do tatuiano Diego Dedablio, que tem trabalhado a cultura popular brasileira. A conclusão das artes deve acontecer nesta próxima semana.
“Baniwa cria seus trabalhos a partir de referências de seu povo assim como de outras cosmologias indígenas da América do Sul. Mescla referências tradicionais e contemporâneas destas culturas, além de suas lutas”, divulgou a assessoria de comunicação da instituição.
“Para o Conservatório, o artista criou a pintura ‘Constelações’, uma resposta à obra da naturalista e ilustradora científica Maria Sibylla Merian, de Frankfurt”, segue a assessoria.
Baniwa relatou que “as obras de Maria retratam a metamorfose dos animais, seguindo vários estágios da vida de insetos, aracnídeos e outros em uma relação direta com plantas, rochas e solo”.
“Seu trabalho é muito importante para pensarmos sobre as relações de troca e mudança que tornam possível a continuidade da vida. Ao contrário da maioria dos artistas de seu tempo, ela estava preocupada em documentar a vida em transformação, nos estágios de mudança dos seres”, observa o artista.
“Em contraste com Maria, o meu trabalho pretende dar um vislumbre de uma relação diferente com a vida, compreendendo o visível e o invisível. Na cosmologia Baniwa, os seres que se transformam e mudam de forma são importantes para a continuidade da vida na Terra”, complementa ele.
Em 2021, Baniwa criou a obra “Autorretrato” para uma empena de 30 metros de altura no Condomínio Edifício Rosemarie, localizado no centro de São Paulo, no Elevado João Goulart, conhecido como “Minhocão”.
A pintura aborda um jovem artista que chega na cidade e descobre novos mundos para explorar. “Trazer a cosmologia Baniwa para o mural, é para que esses seres possam aparecer e cumprir seu propósito de polinizar memórias e transformar florestas, e compartilhar um pouco de mundos indígenas e sua cosmologia”, comenta.
O gerente-geral do Conservatório de Tatuí, Gildemar de Oliveira, frisa que as obras fazem parte de ação da instituição de convidar artistas visuais para criarem e executarem murais artísticos nos muros da sede e da unidade 2.
De acordo com o gerente artístico e pedagógico de artes cênicas, Antônio Salvador, “ações como essa contribuem para a democratização da arte, além de destacar a arte brasileira”.
“A presença de artistas como Baniwa e Dedablio é um grande passo na direção de alinhar a escola com criações e discussões contemporâneas e urgentes na arte e na vida brasileira e mundial”, observou.
“Neste caso, não são só as presenças. É o Conservatório criando condições para que artistas desta importância possam criar obras, transformando a arquitetura da instituição e de seu entorno. É um chamado à responsabilidade de repensarmos o quê, de fato, no Brasil de hoje, um conservatório deve preservar”, reforça.
“Já é visível que a energia do lugar é outra. Desde o início da pintura, as pessoas que passam não param de fotografar, perguntar, e se emocionarem. Tatuí ganha grandes obras de arte a céu aberto”, acrescenta.
Salvador reforça que a instituição está trazendo “novas referências, a fim de reformular o setor de artes cênicas”. “Estamos repensando a programação de teatro e música”, declarou.
“Pensar a arquitetura do espaço escolar é muito importante para quem vive a escola no dia a dia. Então, optamos em fazer essas duas empenas com artísticas renomados, como Baniwa e Dedablio. São quatro faces de uma empena, uma delas com 40 metros de largura por 17,5 metro de altura”, explicou.
Os artistas
Baniwa é um artista plástico que transita pelo universo indígena e seus processos artísticos, em todo o território nacional.
Em 2022, foi curador da exposição “Nakaoda”, no Museu de Arte Moderna (MAM), do Rio de Janeiro. Nos últimos anos, tem ocupado espaços que vão de exposições a residências artísticas em vários lugares do mundo, como Canadá, Estados Unidos, França e Austrália.
Entre as premiações, venceu duas vezes o Prêmio Pipa, em 2019 e 2021, considerada a maior condecoração da arte contemporânea do Brasil. E, em 2014, como ilustrador, recebeu o Prêmio Festival Festas de Lisboa, em Portugal.
Dedablio conta que sua obra “se fundamenta em uma incansável pesquisa da cultura popular brasileira, em contraste com inserções de técnicas e teorias aplicadas de arte moderna e contemporânea, estruturando o neomuralismo, conceito que abrange a arte pública com o refinamento estético, possibilitando aprofundamentos teóricos”.
O artista observa que tem utilizado spray como base e, por vezes, inserido técnicas que harmonizam com o grafite clássico e “enfatizam cores vibrantes, que resultam em uma obra original e com fundamento conceitual considerável, tanto na esfera do grafite mundial, quanto para a contribuição com a arte brasileira e, em destaque, a tatuiana”.
De acordo com ele, há anos vem realizando uma pesquisa fotográfica de Tatuí e seu cotidiano, que é fruto de suas experiências do grafite na cidade, “caminhando e pintando”.
“Prático a ‘street photography’ (fotografia de rua), uma modalidade disseminada por mestres como Gary Winogrand, Henry Cartier Bresson, entre outros grandes fotógrafos”, conta.
“Uso essas fotos como ponto de partida para desenhar os futuros murais, sempre mergulhando neste processo criativo, sem perder as origens como forma de poetizar a realidade”, acrescenta.
Dedablio trabalhou com desenho desde a infância, quando enviava cartas com arte em quadrinhos aos estúdios Maurício de Souza, que o respondia com palavras de incentivo.
Passou a fazer grafite em contato com o skate e a arte de rua. Viajava para São Paulo, com sua máquina fotográfica, para registrar “momentos”. Com o material, criava uma “revista”, cujas fotografias ajudavam o artista a estudar técnicas. Com isso, conta, “encontro seu estilo”.
A atriz tatuiana Vera Holtz conheceu o trabalho dele e o incentivou a aperfeiçoar-se, após adquirir alguns de seus quadros. Dedablio foi estudar na capital paulista, na escola Pan-Americana de Artes e no Museu Lasar Segall.
Em 2014, foi convidado a participar de uma plataforma de arte de rua em Amsterdã, na Holanda, onde produziu um mural de grande escala em um edifício. Em 2016, participou de exposição coletiva pela Verve Galeria, em São Paulo. Em 2017, foi para Minsk, na Bielorrússia, onde produziu o mural “Amanda”.