Que redes sociais, como o Facebook, e privacidade nunca andaram de mãos dadas, isso não é novidade para ninguém. Ocorre que, já há alguns anos, o Facebook e o WhatsApp têm sido questionados severamente na Justiça sobre sua política de privacidade, não somente aqui no Brasil, mas principalmente na Europa.
Em 2011, Max Schrems, um estudante de direito austríaco de Viena, evocou as leis de proteção de direito à privacidade e requereu ao Facebook todas as informações que a empresa detinha sobre ele. Em resposta, teve um dossiê de 1.222 páginas, o qual relacionava todas as páginas que ele compartilhava, incluindo comentários – até os que havia apagado – além de locais que havia frequentado.
Tal experiência fez com que ele fundasse o grupo “Europa contra Facebook”, sendo que a entidade já teve algumas vitórias sobre a gigante norte-americana, como proibi-la de usar uma ferramenta que automaticamente vinculava um nome a um rosto de pessoa em fotos de terceiros. Entre mortos e feridos, recentemente, o Facebook ganhou uma ação contra a autoridade de proteção de dados da Bélgica, a qual buscava impedir que a companhia rastreasse a atividade on-line de pessoas que não são usuárias do Facebook, mas visitaram páginas da rede social.
Cabe ressaltar que o Facebook conseguiu ganhar essa causa alegando que a corte de Bruxelas não tem jurisdição sobre suas atividades, porquanto a empresa controla suas operações europeias da Irlanda, país que não faz parte da União Europeia. Via de regra, na Europa a vida não tem sido fácil para o Facebook, pois o continente, além das rígidas leis de proteção à privacidade dos cidadãos, conta com organismos independentes de fiscalização, como o “Data Protection”, da Irlanda – o mesmo que proibiu o aplicativo de reconhecimento facial.
A coleta de informações do Facebook e de outras empresas norte-americanas, como Google e Microsoft, vai além da possível violação à privacidade do cidadão. Na sociedade da informação, ao monitorar e controlar o comportamento de milhões de pessoas em diferentes nações, tais empresas, intimamente vinculadas ao governo dos Estados Unidos, mesmo que não divulguem nenhuma informação a terceiros, se tornaram os grandes “players” do jogo geopolítico global.
Enquanto na Europa quem passa apertado é o Facebook, aqui no Brasil é a outra empresa do grupo, o WhatsApp, que vem sendo severamente inquirida pela Justiça, mas por razões diferentes. Fenômeno do mundo digital, o WhatsApp, com quase um bilhão de usuários no mundo, aproximadamente um terço dos internautas, é muito utilizado pelos brasileiros, e segundo seus representantes, não tem condições de armazenar todas as conversações de seus usuários.
A Justiça brasileira, através do despacho de vários magistrados, tem entendido que a empresa tem sim que se estruturar para fornecer as informações requeridas e deve se adequar. Essa e outras questões devem ser objeto de lei complementar ao Marco Civil da Internet, que já fez dois anos e poucos efeitos práticos benéficos para o cidadão brasileiro. Para que essa realidade seja mudada, faz-se necessário um esforço conjunto entre Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, a Anatel e Congresso Nacional, no sentido de definir uma agenda para regulamentar importantes questões como essa, intimamente ligada à liberdade – maior bem do cidadão.
* Advogado, empresário de telecomunicações e presidente da Associação das Empresas de Radiocomunicação do Brasil.