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Beijo entre Maria e Damaso selou união de casal no cartório civil
Em média, dez casamentos acontecem por semana no Cartório de Registro Civil de Tatuí. Nenhum deles, até a manhã de segunda-feira, 26, havia tido história tão peculiar como a de Damaso Teixeira de Bittencourt e Maria Poutroli.
O casal oficializou a união no civil depois de sete décadas de “noivado” – eles viviam juntos desde 1945. Por conta do desejo do filho, de 58 anos, e com incentivo de uma amiga em comum, Ana Alice de Almeida Soares, os noivos decidiram tornar-se marido e mulher no papel e “entraram para a história”.
O noivo, de 102 anos, e a noiva, de 90, são as pessoas mais idosas a se casarem na cidade. Bittencourt e Maria conheceram-se em São Paulo, moraram na capital e mudaram-se para Tatuí há 20 anos. Aqui, viveram com parentes até que, com a ajuda de Ana Alice, ganharam um “cantinho particular”.
“Não tenho grau de parentesco com o casal, mas eu os ajudo por pura vontade”, contou a amiga. Ana Alice conheceu Maria Poutroli em 2006, quando tinha um varejão no Boqueirão. O negócio funcionava na rua Teófilo Andrade Gama. “Ela veio parar em casa, pedindo ajuda”, relembrou.
Até então, as duas mantinham relacionamento comercial (cliente e comerciante). Com o tempo, Ana Alice disse que estreitou os laços com a cliente, tornando-se amiga da noiva. “Ela vinha comprar coisas mais baratas no meu varejão. Conversávamos sobre a vida e criamos um laço”, recordou.
Quando a comerciante aposentou, fechou o estabelecimento, mas manteve o contato com Maria. A aproximação fez com que Ana Alice conseguisse superar uma fase difícil da vida dela. “A partir do momento que fiquei viúva, que perdi meu marido, eu convidei a dona Maria para ir morar comigo”.
Passados dois meses, Bittencourt juntou-se à noiva no cômodo ao lado da residência de Ana Alice. “Eles já moravam juntos, mas na casa de parentes. Acredito que tiveram desentendimentos e acabaram ficando comigo”, disse a amiga.
Com os anos de convivência, Ana Alice descobriu que o casal tinha um desejo: unir-se oficialmente. “Eles queriam muito, mas não tinham condições”.
A cerimônia era também um pedido do filho, que não pôde acompanhar o acontecimento. “Ele dizia que não queria ser filho de mãe solteira e cobrava os pais para que se casassem oficialmente”, relatou.
Para atender ao desejo do casal, Ana Alice deu início a uma “via sacra”. Levou dois anos para poder juntar toda a documentação do casal. Há cinco, começou a receber documentos que haviam sido solicitados a cartórios de São Paulo – de onde Maria é natural – e Curitiba – cidade de Bittencourt.
“Consegui tudo por meio dos cartórios e do Poupatempo. Aí, trouxemos toda a documentação na semana passada, quando o casamento foi agendado”, contou.
História de amor
Juntos há 70 anos, Bittencourt e Maria conheceram-se em São Paulo. Ela tinha 20 anos quando se apaixonou pelo marido, na época, então, com 32 anos.
“Eu o conheci trabalhando no Sindicato do Algodão. Ele era presidente da entidade e eu, telefonista, num escritório ao lado”, relatou a noiva.
Desde então, os dois não se desgrudaram mais. Para a noiva, o casamento representou a realização de um sonho. Na confirmação, ela precisou dar “uma forcinha” ao noivo para que ele dissesse o “sim”. Maria sussurrou no ouvido de Bittencourt que ele deveria concordar com o juramento para selar a união.
“Tem que falar sim? Então, sim”, disse ele. Já a noiva não teve dúvidas: “Mais que sim”, declarou ela, ao responder o juiz de paz Luiz Gonzaga Ferraz, no cartório.
A idosa contou que o casamento representou a realização de um sonho do filho e prova especial de companheirismo. “O que uma mulher precisa é atenção e carinho, e isso ele sempre me deu. Como ele, não existe mais”, falou, sobre o noivo.
Sem lua de mel, o casal comemorou a união com bom humor e cumplicidade. “A nossa lua de mel não acabou, ela é eterna. Só é diferente, porque nós somos uma coisa só, e estamos além dos desejos”, declarou a noiva.
A união do casal é citada como exemplo pelo juiz de paz do Cartório de Registro Civil do município. Ferraz afirmou que todas as celebrações são especiais. Entretanto, destacou que a de Bittencourt e Maria tornou-se diferente.
“Não tem como explicar, é de emocionar. Querendo ou não, uma lágrima corre. Faço isso há sete anos e essa união mostra que, para ser feliz, não tem idade”.
O juiz explicou que não existem empecilhos na lei para o casamento de pessoas idosas. As exigências são de que o casal esteja em plena consciência e apto a comparecer até a unidade, ou ter autorização de familiares.
“Um casamento nessa idade é um acontecimento fora do normal. Fazemos em média dez casamentos, mas um desses é raro de acontecer. Nos meus anos como juiz de paz, nunca tinha realizado uma união como essa”, disse Ferraz.
Após a oficialização da união, Maria Poutroli passou a assinar Maria de Bittencourt. Os noivos casaram-se em regime de separação de bens e voltaram para a residência cedida pela amiga, Ana Alice, e aos cuidados dela.
A história do casal chegou até a reportagem por conta de Luiz Antonio Voss Campos. “Estava nos Correios quando vi a Ana Alice. Ela me pediu ajuda porque queria unir o casal, mas não sabia como”, comentou.
Voss também compareceu à cerimônia, iniciada às 11h. Ele acompanhou os noivos até a porta e fez questão de desejar a eles felicidades.
