No segundo semestre do ano de 1966 percorri quase todo o estado de São Paulo fazendo contatos com a imprensa falada e escrita e com lideranças políticas municipais, a serviço da candidatura do professor Carvalho Pinto a senador.
O “professor” – como o chamávamos na intimidade – tinha sido professor na PUC, secretário de finanças na prefeitura, secretário da fazenda estadual, governador do estado e, por pouquíssimo tempo, ministro da fazenda no governo João Goulart.
Seu caráter, competência, sensibilidade, amor à causa pública e decência no exercício das funções públicas credenciaram-no a fortíssimo candidato à presidência da República.
Contudo, o regime instalado em 1964 vinha mudando tudo na esfera jurídica e institucional. Atos e mais atos institucionais… Acabaram-se eleições livres e diretas e partidos políticos. Criou-se a Arena e MDB (Aliança Renovadora Nacional e Movimento Democrático Brasileiro) como um verniz democrático à nova situação histórica brasileira.
O “professor”, surpreendido com tais acontecimentos, recolheu a bandeira de suas pretensões presidenciais alimentadas pelo notável respeito e popularidade que então desfrutava.
O mundo político era outro. Eleições indiretas para presidente e para governador com candidatos gerados no silêncio dos campanários.
Pressionado pelas circunstâncias, aceitou o insistente convite do presidente Castello Branco para que disputasse a eleição de senador por São Paulo. O convite foi acolhido. Era o povo quem elegia o senador. Não havia ainda a figura do senador biônico, escolhido, também, no silêncio dos campanários…
Foi uma guinada de 180 graus nos sonhos da jovem equipe de assessores do “professor”, que imaginavam uma belíssima e empolgante campanha presidencial e uma extraordinária e profunda mudança na vida social e econômica do país.
Assim, um dia me vi entrando em Tatuí, vindo de Itararé, Itapeva, Capão Bonito e Itapetininga, para contatar o prefeito da cidade, sua imprensa e lideranças; uma conversa sobre a vinda do candidato a senador, professor Carvalho Pinto, à “Cidade Ternura”. Adentrei o casarão na rua 15, fui anunciado, e logo apertei a mão do prefeito Paulinho Ribeiro em seu gabinete, de pé, ao lado de sua mesa de trabalho.
Jamais pensei que, desse encontro, fosse nascer a extrema e fraterna amizade que tanto ornou minha vida ao longo de nossos inesquecíveis saraus etílicos, poéticos e musicais que tivemos em São Paulo e Tatuí. Tempo bom, gente!
Prefeito de Tatuí duas vezes, foi um “pacificador” no universo político da época, tempos de “queira ou não queira é Junqueira”… Em sua última gestão, chegaram ao meu ouvido umas “fofocas” segundo as quais Paulinho não estava lá muito bem com a Câmara. Liguei pro Netinho (José Domingos Fogaça), que foi prefeito de Porangaba e vereador em Tatuí, e perguntei: Netinho, como é que está o Paulinho? Algum problema? Ele me respondeu, com aquele seu saboroso sotaque: O Paulinho tá ótimo. Continua cantando e recitando…
Pronto. Fiquei tranquilo e feliz. O rouxinol de Tatuí continuava na dele, e a cidade ouvindo “… eu quero ter um milhão de amigos…”
* Nascido em Missão Velha, no cariri cearense, é procurador aposentado do Estado de São Paulo. Tem poemas e crônicas publicadas em Portugal e na Argentina. Autor de diversos livros e colunista do jornal O Progresso.