Alzheimer Social

Aqui, Ali, Acolá

José Ortiz de Camargo Neto *

Frase do dia: “Recordar é viver, eu ontem sonhei com você” (Aldacir, Marins e Macedo, Carnaval de 1955)

Quando viajei a Tatuí, dia 1º, para o lançamento de meus livros no Museu Histórico “Paulo Setúbal”, passeei de carro por seus lugares inesquecíveis, como quem visita, emocionado, uma velha amiga.

Percorri a antiquíssima Avenida das Mangueiras, nascida antes de mim, feliz porque ainda posso passear por ela, contemplar suas mangueiras, colher as mangas que caíram no solo e descobrir nelas o sabor de minha infância.

Fui rever o Jardim da Santa, com a famosa santa e o mais famoso ainda pinheirão; o Jardim do Junqueira, a Praça da Matriz, a igreja da praça, o Museu “Paulo Setúbal”, o Conservatório, o velho e vetusto “Barão de Suruí”, o Grupo Escolar “João Florêncio”, todos marcos imutáveis do passado, que atravessam as décadas

Neles brincam alegres as crianças; neles passeiam depois, quando jovens; por eles passam quando adultos; neles descansam quando idosos; neles recordam, então os tempos outrora felizes.

Marcos arquitetônicos são assim. São marcos da memória. Que, quando os vemos, trazem-nos as recordações de tempos idos. São ativadores das lembranças e do amor.

Agora imaginem se, por uma desgraça, esses locais fossem demolidos e dessem lugar a prédios novos de vários andares. Quando passássemos por eles, não nos reconheceríamos mais. Nenhuma memória viria à tona. Apenas o desgosto de olhar para o non sense.

É a isso que chamo de Alzheimer Social.

Por isso, precisamos preservar com carinho cada local como esses que citei. Conservá-los como eram ao ser construídos. Para que cada criança, cada jovem que passou por eles, possa viajar no tempo das lembranças quando os virem, anos depois.

Em São Paulo estão cada vez mais desaparecendo as belas casas e palacetes do Jardim Paulistano, as antigas lojas da rua Butantã, para dar lugar à sanha da especulação imobiliária, a construção sem fim de prédios e mais prédios e me pergunto: para quê? Para quem? Se hoje as pessoas trabalham cada vez mais em casa e os prédios de empresas estão cada vez mais vazios?

A verdade é que, quando caminho pela avenida Rebouças, como fazia desde a década de 70, cada vez a reconheço menos. É como se estivesse caminhando em outro planeta. Passando por construções e lugares que não me trazem nenhuma inspiração, nenhuma recordação.

Tatuí, não deixe que esse terrível mal atinja nossa terra, porque não há nada pior do que destruir a memória de nossa cidade (e assim, de nós mesmos).

Até logo.

* Jornalista e escritor tatuiano