Como esperado, a perda da minha vó Leila afetou muito o meu vô e ele faleceu no dia 17 de janeiro.
Eu amei demais o meu vô. Nós tínhamos uma conexão forte e eu sempre o considerei meu segundo pai. Quando o vi pela última vez, eu sabia que era uma despedida. Ele estava fraco e mal conseguia falar, mas com muito esforço ele disse que me amava e que eu ainda era a preferida dele. A gente se abraçou e chorou juntos. Ah, aquele abraço era tão acolhedor…
Eu aprendi a gostar de goiabada com queijo graças ao meu vô. Ele tinha mania de esconder a goiabada em um dos quartos de visita e, quando eu ia visitar meus avós, ele me chamava discretamente pra me mostrar onde ele colocou a goiabada. Toda vez que eu como goiabada com queijo eu sinto um gosto de infância e me recordo dos momentos preciosos que passei com ele.
Certas coisas vêm à minha cabeça quando eu penso no meu vô: fotografia, jornal, futebol, cadeira de balanço e café. Como todos sabem, meu bisavô José Menezes fundou a famosa “Foto Menezes”, que então passou para o meu vô Gilton. A loja durou quase um centenário! Meu vô ficava sentado na cadeirinha dele atrás do balcão observando a rua e sorrindo para os clientes.
Na loja, existia uma porta secreta que dava para a casa dos meus avós no andar de cima. Na sala, eles sempre assistiam filmes juntos (meu vô na clássica cadeira de balanço e minha vó no sofá). Aos domingos, ele assistia futebol com aquele olhar bem concentrado, sem piscar um minuto. Era de se admirar! Porém, após tomar algumas cervejinhas com meu pai, ele caia no sono com a boca bem aberta e, às vezes, roncava.
Meus avós tinham uma rotina sagrada. De manhã, eles tomavam café juntos lendo jornal. Meu vô tinha um jeito peculiar de tomar café, com o dedo mindinho pra cima segurando o copo (aqui na Inglaterra há quem diga que é um jeito chique de tomar chá!).
Meu vô gostava do café bem forte e doce, mas, quando era ele que tinha feito, a única coisa que você poderia sentir era gosto de açúcar puro. Nossa, como o café do meu avô era doce!
Eu tive uma admiração profunda pelo meu vô Gilton por ter sido um companheirão para a minha vó Leila. Nunca existiu e nunca existirá um amor como o deles. Era surreal, puro, romântico, coisa de cinema! Eles simplesmente foram feitos um para o outro e eram a definição perfeita de companheirismo. Pertenciam um ao outro como ímãs.
Enquanto a saúde permitiu, eles iam ao cemitério todo domingo de manhã visitar o túmulo do Emílio. Deve ter sido tão difícil quando passaram a visitar dois filhos no mesmo túmulo, mas eles se apoiavam um ao outro.
Meu vô fazia tudo para ver minha vó feliz. Eu atormentava tanto ela com as minhas brincadeiras dizendo que ela abusava dele, que ele fazia muita coisa (deixava ela doida, coitada!). Ele ajudava a lavar louça, enrolar a massa das famosas esfihas, lavar roupa, levá-la ao fórum – o que você imaginar! Eu nunca vi o meu vô perder a paciência ouvindo tantos “Gilton pra cá, Gilton pra lá” vindo da minha vó constantemente.
Eles eram inseparáveis e estavam sempre de mãos dadas. Era a coisa mais fofa do mundo! Tudo o que ele queria era estar ao lado dela, confortando-a e amando-a.
Meus avós completariam 69 anos de casados este mês, mas eles compartilharam uma vida juntos por mais de 70 anos. Meu vô era superbonitão e elegante quando era mais jovem – cabelo escuro, olhos azuis. Todas as vezes que vejo fotos antigas eu penso “minha avó não perdeu tempo!”, e não era à toa que, às vezes, ela tinha ciúmes dele.
A perda da minha vó partiu o coração do meu vô. Sem ela, a vida dele perdeu o propósito.
Eu sentirei saudades imensas dele. Sentir-se aliviada e triste ao mesmo tempo é uma sensação estranha. Seria tão bom se as pessoas durassem para sempre…
Descanse em paz, vô. Espero que você reencontre a sua heroína e possa segurar a mão dela novamente.
Leilinha
Lindo texto, Leilinha
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Ela e o Gilton são muito evoluídos.
Sinto-me privilegiado por ter convivido um pouco e aprendido muito com eles.