Segunda-feira da semana passada, 4, ocorreu a inauguração da nova sede da Casa de Acolhimento Institucional em Tatuí, denominada “Cecília Sansigolo Simões de Almeida”, por iniciativa da prefeitura, pela Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social, em parceria com o Ministério Público.
Basicamente, trata-se de um serviço essencial, de caráter humanitário, sobretudo. A despeito disto – certamente por falta de informação -, houve uma ou outra manifestação negativa, as quais poderiam ser entendidas como surpreendentes.
Antes de observá-las, é importante reforçar determinados fatos. O novo espaço tem capacidade para receber até 20 crianças e adolescentes, com idades entre sete e 17 anos.
De acordo com o secretário municipal da Assistência Social, Wilian Alexandre Nunes da Silva, a antiga casa, localizada na rua 11 de agosto, apesar de ter suprido as necessidades dos acolhidos, tinha custo mensal de R$ 4.000 em aluguel para a prefeitura. Desta forma, segundo ele, com o prédio próprio, esse valor deve ser revertido em melhorias para os abrigados.
Ele conta que a obra teve custo de R$ 1 milhão, sendo R$ 500 mil com recursos oriundos da prefeitura, como contrapartida, e R$ 500 mil do MP.
Fundada em abril de 2002, a Casa de Acolhimento Institucional já ocupou vários imóveis na cidade. Com a inauguração do novo espaço, Silva acredita que “as crianças possam sentir-se menos impactadas ao chegarem no abrigo”. Em razão disso, segundo ele, a casa foi construída com “um olhar humanizado”, assemelhando-se ao cotidiano familiar.
“Para que isso pudesse acontecer, pensamos desde as cores da parede, a disposição dos móveis, a casinha do cachorro, campinho de futebol, rede de vôlei, jogos lúdicos, sala de informática, dentre outros aspectos, para que as crianças possam se sentir bem, além de poderem desenvolver habilidades socioemocionais”, salientou.
Silva aponta o trabalho do Fundo Social de Solidariedade de Tatuí (Fusstat) como essencial para que o imóvel pudesse contar com um ambiente de “aspecto materno”.
“O time da Assistência Social também trabalhou incansavelmente, dedicando-se desde a pré até a pós-inauguração, além de estarem diuturnamente aos cuidados das crianças”, reforçou.
Atualmente, a casa abriga 13 crianças e, buscando justamente tornar o funcionamento dela “o mais próximo possível de um lar”, os residentes possuem uma rotina regrada e com horários estabelecidos.
Ele conta que as crianças têm hora certa para acordar e escovar os dentes, além de horários para alimentação e escola. Eles ainda frequentam projetos sociais e cursos, fora os momentos de lazer, nos quais assistem televisão, jogam e usam computador. “Tudo de acordo com o desejo e anseio de cada criança e adolescente”, frisou.
Para assemelhar-se ainda mais com o ambiente familiar, as crianças contam com dois cachorros de estimação: o “Totó” e a “Princesa”. “Tudo isso para fortalecer os vínculos”, salientou.
Silva conta que as crianças chegam à Casa de Acolhimento por meio de medidas protetivas, pelas quais a Justiça impede que voltem a frequentar a casa de familiares.
“Mas, vale lembrar que o lar é temporário e a família é acompanhada, visando o retorno ou a inserção da criança com parentes próximos, quando possível”, esclarece.
Entretanto, segundo Silva, já houve casos em que o abrigado permaneceu na casa até a idade limite de 17 anos. Quando isso acontece, o jovem é preparado para essa nova fase, tanto psicologicamente quanto pela busca de inserção no mercado de trabalho. A ideia é que o adolescente tenha “autonomia para seguir com a vida” fora do abrigo.
Nesse sentido, o prefeito Miguel Lopes Cardoso Júnior sancionou a lei 040/2021, que concede a “Bolsa Serviço de Acolhimento em República”.
O benefício, segundo o Executivo, tem como objetivo garantir auxílio pecuniário no valor de um salário-mínimo federal aos jovens com idades entre 18 e 21 anos que vivenciam o processo de transição da situação de acolhimento institucional para uma vida autônoma e inserida na comunidade.
Silva explica que, para a concessão do suporte, que pode ocorrer entre 12 e 36 meses, o beneficiário precisa ser egresso da Casa de Acolhimento, estar em situação de vulnerabilidade e risco pessoal e social, com vínculos familiares rompidos ou extremamente fragilizados, além de sem meios para a autossustentação, entre outros requisitos.
O acesso ao benefício é avaliado por uma equipe técnica do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas), com apoio da Casa de Acolhimento Institucional de Tatuí (Cait), além da Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social.
De acordo com Silva, com o passar dos anos e não sendo possível a reinserção da criança na família biológica, ela segue para o processo de adoção. Antes disso, recebe tratamento psicológico e serviço multidisciplinar.
“Quando são esgotadas todas as possibilidades de retorno ao núcleo familiar, as crianças e adolescentes podem ser adotados, mediante a destituição do poder familiar pelo Judiciário. Os procedimentos e cadastro para adoção são realizados na Vara da Infância e Juventude”, esclarece.
Silva acentua que, caso a criança em processo de adoção tenha irmãos, a prioridade é que sejam adotados juntos. Ainda disse ser importante esclarecer algumas pessoas que ainda confundem o trabalho da Casa de Acolhimento com a Fundação Casa.
E é aqui que a confusão ganha certo corpo, anabolizada pelo típico veneninho a correr nas veias das redes sociais. Basicamente, confunde-se – propositadamente ou não – o menor infrator com aquele em situação de risco ou vulnerabilidade social, vítimas de maus-tratos, abandono ou negligência.
O secretário exemplifica as diferenças: “A de acolhimento faz parte da tipificação nacional dos serviços socioassistenciais, sendo de caráter provisório e excepcional”.
“No local, são acolhidos crianças e adolescentes vítimas de alguma violação de direitos previstos no ECA. Ao contrário da Fundação Casa, na qual adolescentes em conflito com a lei cumprem medida socioeducativa”, detalha Silva.
Na prática, a carência de atenção sobre algo tão desumano, que é abandonar ou maltratar crianças, não deixa de ser, por sua vez, mais um sintoma do processo de insensibilização ainda a contaminar parte da “sociedade”.
Ainda não seria absurdo lembrar que, mesmo se fossem menores infratores, ainda assim seriam crianças… Razão pela qual, antes de sentenciá-las a um futuro perdido, seria mais humano tentar direcioná-las a uma vida com mais opções de trabalho, dignidade, paz e alegrias!
Neste caso, entretanto, os menores não são “bandidos”: são crianças maltratadas, abandonadas, sofridas, sem perspectiva, sem carinho! Se não tiverem a solidariedade de todos, se não receberem o tal “amor ao próximo” tão falado e tão pouco praticado, aí, sim, podem acabar passando do acolhimento para o recolhimento…
E, com certeza, ninguém deseja isso – pelo menos não os seres humanos de fato.