Da reportagem
Após mais de três meses da inauguração, em 16 de setembro de 2022, a Casa de Apoio ao Tratamento de Câncer de Tatuí “Gildete Spuri de Abreu”, no município de Jaú, recebeu 1.680 pessoas, entre pacientes e acompanhantes, que realizam tratamento no Hospital Amaral Carvalho (HAC)
De acordo com dados fornecidos pela Secretaria de Direitos Humanos, Família e Cidadania, atualmente, há 288 pacientes cadastrados, sendo 128 homens e 160 mulheres.
O HAC está a 193 quilômetros de Tatuí. Desta forma, para irem ao hospital e, posteriormente, retornarem ao município, os pacientes tatuianos têm de percorrer, no mínimo, 390 quilômetros.
Para o prefeito Miguel Lopes Cardoso Júnior, após os quatro meses de implantação, “o projeto se mostra um sucesso e uma referência”. “Era um sonho que se realizou, e o número de pessoas atendidas mostra como a casa revolucionou essa questão que estava atormentando meus pensamentos muito antes de eu chefiar o Executivo municipal”, afirmou.
“Não me conformava em saber sobre o sofrimento que as pessoas que não tinham recursos para se hospedar em Jaú passavam por lá”, acrescentou o prefeito.
“Quando se faz política da forma certa, os resultados aparecem, como este que vemos agora. Sabemos que este não é um mundo fácil, mas temos de lutar por coisas que levem dignidade às pessoas”, sustentou.
Segundo Cardoso Júnior, agora, com o espaço em funcionamento, será possível ter ideia das próximas necessidades, como futuras melhorias e adequações, entre outros fatores.
“As doações foram fundamentais. Tatuí é uma terra abençoada por Deus. Agora, vamos instalar também ares-condicionados, já que a região é muito quente e nossos pacientes e hóspedes merecem o devido conforto”, antecipou.
“É preciso observar o desenrolar dos trabalhos. Os desafios existem para serem enfrentados, e nós seguiremos firmes para que a Casa de Apoio cumpra o seu papel. Obrigado a todos que colaboraram”, realçou Cardoso Júnior.
Ele contou ter sido fiador da casa, juntamente com a esposa, a primeira-dama Regiane Rosa de Oliveira Cardoso. “Em razão de a imobiliária ter tido problemas com outras prefeituras, por conta de falta de pagamentos, adotou a política de não fazer mais contrato com o poder público. Por conta disso, para conseguir a locação da casa, fomos os fiadores”, explicou.
Em seu gabinete, Cardoso Júnior acompanha diariamente, por meio de câmeras instaladas na Casa de Apoio, a movimentação dos pacientes e hospedes.
“Não tem preço ver o quanto os esforços deram certo. Proporcionar esta alternativa a essas pessoas que estão passando por momentos difíceis em suas vidas mostra que não importa ideologia, e, sim, trabalhar para o bem-estar de nossa população”, ressaltou.
A casa é administrada por meio de parceria entre a prefeitura e a Litac (Liga Tatuiana de Assistência aos Cancerosos), presidida por Gilda Mascarenhas Bertanha, firmada no dia 15 de agosto de 2022.
No local, trabalham duas pessoas: a cozinheira Elaine Cristina Sampaio de Oliveira e a auxiliar de serviços gerais Antônia Aparecida – contratações frutos de convênio entre a prefeitura e a Litac.
No total, há três quartos com camas, sendo dois femininos e um masculino. Há um espaço com duas camas hospitalares e dois “cadeirões do papai”. Além disso, a casa possui um quarto para os motoristas e mais oito camas dobráveis de reserva.
Há uma cozinha ampla, com freezer, micro-ondas, fogão semi-industrial, balcão aparador, bebedouro purificador. Também há uma sala grande, com sofás, uma TV de 55 polegadas, um “cadeirão do papai” e mais duas cadeiras para descanso, além da sala de jantar, contendo uma mesa de com oito cadeiras e uma área externa de convivência para café, contendo uma mesa para seis lugares, dois armários de guarda-volumes e duas cadeiras de rodas, sendo uma para obeso.
A estrutura da casa possui banheiros masculino e feminino, contendo lavabo, barras de apoio, assentos elevados para vaso sanitário e dois adaptadores de parede para banho e cadeira de banho para obeso.
Por fim, há máquinas de lavar roupas e todos os eletrodomésticos necessários para uma casa normal.
No dia 7 de novembro de 2022, durante sessão ordinária, o então presidente da Câmara Municipal, vereador Antonio Marcos de Abreu (PSDB), garantiu mais R$150 mil para equipar a Casa de Apoio. O recurso era referente à economia feita pelos parlamentares ao longo de 2022.
Com a quantia, a intenção é adquirir equipamentos como aparelho de ar-condicionado, televisão de 65 polegadas, geladeira, tanquinho, sofás, sanduicheira, panela elétrica, batedeira, secador, cama hospitalar e seis camas boxes.
Segundo a chefe da pasta, Elaine Leite de Camargo Miranda, a secretaria tem acolhido o paciente e seu acompanhante mediante um cadastro realizado juntamente com a responsável pela casa, Valdirene Souza Menezes, em Tatuí.
Para isso, é preciso levar os documentos que indicam o tratamento no HAC, documentos pessoais, RG, comprovante de endereço, cartão SUS (Sistema Único de Saúde) do paciente e respectivo acompanhante.
A partir disso, é preenchido uma ficha cadastral e os pacientes são orientados e recebem uma lista de regras da Casa. Então, informam se passarão o dia e realizar as refeições no local ou se irão também pernoitar.
Sobre o tempo de permanência, depende do tratamento, quimioterapia, radioterapia ou apenas consultas – ou seja, é ilimitado, de acordo com a necessidade do paciente até a alta.
Mais informações podem ser obtidas pelo telefone (15) 3259-8407. A casa é situada na rua Francisco Carvalhaes de Paiva, 140, no bairro Chácara Braz Miraglia.
O transporte municipal para Jaú, composto sempre por dois motoristas, também informa sobre detalhes e fluxo da utilização da casa. “Na hora do agendamento, esses profissionais perguntam aos pacientes se irão utilizar a casa, para que o serviço lá seja efetuado de forma correta, principalmente na questão alimentar. Há um monitoramento constante entre a secretaria e os profissionais que trabalham no espaço”, afirmou Elaine.
“Além disso, todos os dias ficamos responsáveis por passar os relatórios para a governanta do número de pacientes e acompanhantes que irão utilizar a casa para alimentação e pernoite”, explicou.
Conforme Elaine, semanalmente ou quinzenalmente, ela visita a casa, junto à nutricionista Maria Cecília Peixoto, responsável pela elaboração do cardápio, para abastecer as necessidades do local.
Todos os alimentos são adquiridos através do Banco de Alimentos, da Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente, que são embalados e possuem um informe com a data de validade.
“Este é um processo de controle de qualidade rigoroso, para que tudo seja feito da melhor forma possível e garanta o conforto das pessoas”, mencionou a secretária.
“Essa ação do Banco de Alimentos contribui para a promoção da saúde, segurança social de convívio, acolhida e autonomia dessas pessoas, além de estarmos incluindo a formação de práticas alimentares totalmente saudáveis, por meio de ações de educação alimentar e nutricional das famílias, entidades e também aos beneficiários da Casa de Apoio”, enfatizou.
Os cardápios são planejados e elaborados considerando a inserção do “hábito alimentar saudável”. “É usado tudo o mais natural possível e não há a agregação de temperos, produtos com corantes, sucos artificiais, por exemplo”, pontuou Elaine.
O menu é elaborado distintamente, atendendo às necessidades nutricionais de cada paciente, já que cada um tem um caso distinto. Com isso, para cada enfermidade, há uma dieta específica. Desta forma, atendem-se os valores nutricionais conforme cada perfil.
De acordo com Elaine, dependendo do atendimento médico realizado, os beneficiários da casa realizam até cinco refeições diárias, sendo que grande maioria fica hospedada por um ou até cinco dias, nos quais recebem café da manhã, almoço, lanche da tarde, jantar com sopas, caldos e cremes e lanche de ceia. Todas as refeições estão destinadas aos pacientes e acompanhantes.
A secretária destacou que os alimentos enviados à casa são da horta municipal, onde não há uso de defensivos agrícolas, e, sim, de defensivos naturais para o plantio de couve, repolho, cebolinha verde, salsa, quiabo, couve-flor, repolho, berinjela, abobrinha, mandioca e milho.
Na própria Casa de Apoio, foram plantadas ervas para chás, usadas para os hospedes. “A ideia básica desta farmácia viva é ter sempre ao alcance das mãos as plantas medicinais indicadas para o tratamento de sintomas e doenças de menor gravidade, para tratá-los dos sintomas de gripe, problemas estomacais e dores de cabeça”, explicou Elaine.
Paciente curada
A monitora Amanda Cibele dos Santos Fidêncio, que trabalha na Emei “Doutor Arthur Avalone”, é uma das pacientes assistidas pela Casa de Apoio de Jaú e realiza o tratamento contra câncer de mama triplo negativo desde agosto de 2021.
A O Progresso de Tatuí, ela contou que utiliza os serviços da casa desde o início de dezembro do ano passado, viajando de segunda-feira a sexta-feira para lá, saindo às 2h30 da manhã e retornando no final da tarde ou início da noite, com a frota municipal.
As sessões de radioterapia que realiza no HAC duram, em média, 15 minutos. “Antes, eu vinha com minha própria condução. A casa veio no momento certo, pois muitas pessoas não têm condições de alugar um local em Jaú ou pagar diárias em pousadas e hotéis e acabavam aguardando a frota até tarde, na cidade, sem respaldo algum, por conta da consulta de outros pacientes, que terminava mais tarde”, comentou.
Ela relatou que, antes do projeto da Casa de Jaú, a falta de estrutura para os pacientes gerava incômodos. “Isso desmotivava as pessoas. Era um sofrimento”, lembrou.
“Agora, com o espaço disponibilizado pela prefeitura, isso mudou. O espaço fica a quatro minutos a pé do hospital. Eu me sinto em casa quando venho para Jaú. O ambiente é agradável, e isso fortalece os pacientes e os acompanhantes”, frisou.
“Esse espaço é um divisor de águas para nós que tratamos do câncer na cidade e temos que viajar muitas horas. Além disso, a convivência com outras pessoas vítimas desta doença é uma experiência enriquecedora e emocionante, pois cada uma tem uma história de vida e dificuldades distintas. E, na casa, todos estão juntos em busca de dias melhores, mesmo a caminhada sendo longa”, descreveu.
Para o tratamento contra o câncer, Amanda modificou a alimentação, passando a descartar enlatados, leite e açúcar. Ela ressaltou a atenção dada pelos profissionais que atuam na Casa.
“Eles preparam um cardápio especial, com base na dieta de cada paciente. Sempre há frutas, bolachas, sopas e refogados. Tudo feito com carinho para que as pessoas fiquem bem nutridas, mesmo com as limitações receitadas pelos médicos”, mencionou.
Amanda também observou o papel da equipe de motoristas da frota: “Eles são de suma importância para nós. A forma como nos tratam, desde quando nos pegam em casa, até o retorno para Tatuí é maravilhosa”.
“Não é fácil conviver com os problemas dos outros. Muitas acabam sendo excelentes ouvintes e até conselheiros, já que há tratamentos que são extremamente invasivos e os pacientes voltam para a casa bem debilitados. Eles já se tornaram da nossa família. Isso tudo torna a viagem mais leve”, acentuou.
Segundo ela, o câncer que vem tratando é considerado um dos mais agressivos, pois as células cancerígenas crescem e se multiplicam rapidamente, com maior chance de reaparecerem em outras partes do corpo, ocasionando a metástase.
“A classificação como triplo negativo ocorre porque, neste caso, não há a presença dos receptores de estrogênio, progesterona, responsáveis pelo controle do crescimento do tumor, das células mamárias e da divisão celular”, explicou.
Amanda pontuou que, após perceber um caroço na região da axila, resolveu fazer exames para saber do que se tratava. Ela chegou a passar por profissionais das áreas da ginecologia, dermatologia, que afirmavam que se tratava de uma bactéria que havia atuado em uma glândula inflamada, sendo-lhe dado anti-inflamatório e antibiótico para acabar com a dor.
Após a realização de exame pedido por um ginecologista, o resultado apontou que se tratava de uma suspeita de malignidade. “Realizei tomografias e cintilografias, que vieram com o diagnóstico de carcinoma. Com isso, consultei um citologista, que encaminhou meu caso ao HAC, que aceitou rapidamente”, contextualizou.
A monitora contou que no hospital há um grupo de profissionais que vem desenvolvendo pesquisas referentes ao tipo de câncer que ela tem, por conta de suas complexidades.
Amanda reforçou que o apoio do marido, Diego, e do filho, Henrique, é fundamental durante o tratamento, que se encerrará em breve.
“Eles têm me ajudado muito, e passei a enxergar as coisas de uma outra forma. Encarei com naturalidade, mesmo sabendo das dificuldades. Acho que, desta forma, ajudo outras pessoas que passam pelo mesmo problema a vê-lo de uma outra forma. Não mudei minha rotina. Segui em frente”, acrescentou.
Com as 12 sessões de quimioterapia, a monitora passou por uma cirurgia, e o diagnóstico figurou resposta completa ao tratamento, fato que, segundo ela, no caso do câncer de mama triplo negativo e com tumoração grande, é algo raro.
“Os médicos se surpreenderam com o resultado e afirmaram que, com isso, as chances de um reaparecimento caem consideravelmente”, comemorou.
Assim que terminar as sessões de radioterapia, no final da primeira quinzena deste mês, Amanda seguirá realizando bateria de exames a cada seis meses como forma de prevenção.
“Nesses 16 meses de tratamento, mudei o jeito de olhar a vida. Conviver com pacientes na Casa de Jaú, trocando experiências vivenciais com eles, tornou todo esse processo mais humanizado”, sustentou.
“Agradeço a todos que têm me ajudado e ao prefeito Cardoso Júnior, pelo empenho na conquista desse espaço tão vital para os tatuianos”, concluiu Amanda.