Da reportagem
Tatuí é uma das cidades vencedoras do Prêmio “Movimento das Cidades”. Entre quase 400 concorrentes, a iniciativa “Viva o Cururu de Tatuí”, de Rose Tureck, Thony Guedes e Maria Augusta de Abreu, foi uma das dez contempladas com premiação em dinheiro e mentoria profissional.
O tio estima colocar o projeto em prática ainda neste mês, iniciando-o em uma “escola-piloto”.
Os tatuianos são os desenvolvedores do projeto, que busca promover o “conhecimento e apreciação do cururu” para as novas gerações, além de abrir espaço para apresentações em espaços urbanos.
O cururu, dentro da cultura musical brasileira, assume três significados distintos, eles explicam. Por exemplo, uma dança típica da região do Pantanal, no Mato Grosso do Sul. Cururu também é um típico ritmo da música caipira brasileira. Mas, na região do Médio Tietê, da qual Tatuí faz parte, é o nome do “canto de improviso”, uma tradição histórica.
Na cultura regional, o cururu consiste em um duelo entre dois cantadores. Um “puxa o assunto” e o outro deve rebater, sempre no improviso. Há também o violeiro, que dita o ritmo da “batalha” – uma cultura antiga, que passou por bandeirantes e tropeiros.
“Uma das mais autênticas manifestações da cultura raiz”, como afirma Rose Tureck, a tradição enfrenta, atualmente, um grande problema: a falta de conhecimento e interesse das novas gerações, as quais, “se realmente não se interessarem, podem, indiretamente, contribuir com a morte do cururu na região”.
Segundo Rose, neste momento, há em Tatuí apenas dez cantadores, todos já idosos. Em Piracicaba, outra cidade conhecida por manter a tradição cururueira, apenas um.
“Por isso nos inscrevemos, precisamos acelerar esse processo de conhecimento e implementação do cururu nas cidades, pois, se os atuais cururueiros se forem, meu medo é que acabe de vez”, completa.
Guedes, que também partilha desse temor, ainda traz o exemplo do samba caipira de Quadra, que praticamente não existe mais. Segundo ele, “havia quatro irmãos que cantavam, mas, quando eles morreram, não sobrou ninguém, além de um familiar para continuar o trabalho, que pode desaparecer”.
Atualmente, o cururu sobrevive na zona rural da cidade. Para Guedes, isso se dá devido à diversificação da cultura e à falta de apoio, visibilidade e, principalmente, conhecimento. “Nossa ideia é retomar essa cultura na cidade, onde está o grande público. Na zona rural, eles continuam, têm um público fiel, mas precisam se apresentar na cidade”, completa.
Nesse sentido que o projeto atuará. Em parceria com o Museu Histórico “Paulo Setúbal”, as secretarias da Educação e do Esporte, Cultura, Turismo e Lazer e os cururueiros, a iniciativa buscará atrair a atenção das “novas gerações” através do conhecimento.
Em um primeiro momento, o projeto contará com uma “escola-piloto”, onde os professores, de português (que trabalharão a criação das rimas) e história (que passarão toda a tradição) receberão uma cartilha, elaborada pelo artista plástico Jaime Pinheiro, com todo o necessário sobre o tema.
A escola ainda não foi divulgada, mas o projeto será iniciado, no máximo, na segunda quinzena de maio. Após esse período, e a depender da aceitação do público em geral, o projeto deverá ser ampliado.
A previsão é de que, inclusive, seja expandido rapidamente para fora das escolas, sendo implantado diretamente na cidade.
No começo, de acordo com Guedes, as crianças irão escrever as rimas com as professoras de português, para ir trabalhando nas frases. Porém, aqueles que tiverem maior desenvoltura e interesse poderão ir se aprimorando no improviso.
Guedes e Rose concordam que o conhecimento é a chave para a divulgação do cururu. Ele ainda completa: “Há pessoas que até conheceram, mas ouviram uma ou duas vezes e acharam ruim, não entenderam, justamente por não compreenderem essa importância cultural. A ideia é germinar uma semente para poder colher frutos no futuro”.
Por mais que o projeto não tenha ainda começado, os cururueiros realizaram, no mês passado, uma apresentação do lado de fora do museu. “Muitos passavam de carro e, quando viam eles se apresentando, paravam para acompanhar. Nisso, juntamos muita gente”, conta Rose.
O projeto prevê, além do que será colocado em prática na escola, uma apresentação no fim de agosto, que juntará alunos, professores e cururueiros no museu “PS”. Rose e Guedes também não descartam torneios, com “batalhas” de cururu entre salas ou, até mesmo, no futuro, em escolas.
O prêmio “Movimento das Cidades” surgiu após um estudo realizado pela agência Virtù, em pareceria com a organização CLP – Liderança Pública, contando com apoio do Grupo CCR e apresentação de Marcelo Tas, com o objetivo de encontrar “soluções concretas para desafios urgentes das cidades”.
Segundo Rose, a CCR tinha esse projeto desde 2020, mas teve de adiá-lo devido à pandemia de Covid-19. Em dezembro de 2021, quando foi retomado, o trio tatuiano inscreveu o projeto.
Após ser premiado, a iniciativa recebeu a mentoria da CLP, que, ainda em decorrência da pandemia de Covid-19, aconteceu de maneira remota nos últimos dois meses.
Por sua vez, a apresentação em São Paulo, para o júri da CCR, aconteceu presencialmente, na sexta-feira, 6, junto aos outros nove contemplados.
Com projetos diversos, desde problemas com mobilidade urbana a dificuldades socioambientais, a apresentação de Tatuí, com o cururueiro Josué, “agradou ao público”, como disse Rose.
“Quando o Marcelo (Tas) nos viu subindo ao palco, com Josué segurando sua viola, ele se impressionou. Me perguntou se teria música e eu falei que tinha de falar rapidinho para dar tempo, se a plateia permitisse, de ele tocar um pouco. Após o show, um rapaz do júri me disse que, se soubesse que seria tão bom, nem me deixaria falar, íamos direto para a viola”, relata.
Além de Tatuí, Águas da Prata, Avaré, Barueri, Bragança Paulista, Campinas, Itapeva, Louveira, Osasco e Sorocaba foram as outras cidades contempladas com o prêmio, que envolveu diversas cidades do interior paulista. Ao todo, cerca de 400 projetos se inscreveram e foram analisados pelo júri.