O chamado “Brexit” (British Exit) já era esperado há muito tempo, apesar de ter surpreendido a quase todos no mundo. Desde o início da formação da então chamada CEE (Comunidade Econômica Europeia), já se desenhava a formação de um bloco econômico com grandes assimetrias, que invariavelmente acabaria por desembocar num processo de divórcio, iniciado pelo Reino Unido, podendo levar também ao êxodo de outros países.
As diferenças são muitas: idiomas; extensões territoriais; legislações trabalhistas; desníveis acentuados com relação à qualidade dos sistemas de ensino; disparidades gritantes em relação ao grau de competitividade das empresas de cada país; diferentes graus de aptidão ou falta dela, no tocante ao empreendedorismo; sistemas tributários mais ou menos hostis à acumulação de patrimônio; distribuição da estrutura demográfica; solidez das Finanças Públicas; etc.
Já antevendo a possibilidade desse desfecho, sabiamente, as autoridades britânicas nunca permitiram que a secularmente confiável libra esterlina fosse trocada pelo euro, o que proporcionará ao Reino Unido uma grande vantagem, quando ao final dos próximos dois anos, se desvincular definitivamente das onerosas obrigações advindas de membro da União Europeia.
Muitos fatos colaboraram para que os britânicos tomassem tal decisão: 1) terrorismo, agravado com a facilidade do fluxo de pessoas decorrente do livre trânsito proporcionado pelo grande espaço europeu; 2) fluxos migratórios incontroláveis, causados pela necessidade de acolhimento de refugiados de países assolados por guerras ou desastres naturais; 3) sobrecarga do sistema de saúde causado pelo fluxo migratório; 4) concorrência aos postos de trabalho britânico, por pessoas dispostas a trabalhar por qualquer remuneração, em função do estado de miserabilidade em que se encontram (refugiados); 5) como o Reino Unido sempre enviou mais dinheiro para Bruxelas do que dela recebeu, naturalmente, convenceu as autoridades fazendárias de que tal fato era nocivo às finanças domésticas, já que Portugal, Espanha, Itália e Grécia são permanentes usuários dos programas de socorro financeiro, pois não conseguem transformar suas respectivas economias em entes competitivos.
São os chamados “cinturões de ferrugem” da Europa. Problema crônico e aparentemente insolúvel no curto prazo. Quanto ao Brasil, pouco deverá ser afetado pelo fenômeno, já que o fluxo de comércio Brasil/Reino Unido é muito pequeno, dado os valores transacionados. Porém, não há garantias de que, em função da atual fragilidade das finanças públicas, não sejamos afetados por algum grau de volatilidade na economia mundial, no caso de haver outras defecções de países na União Europeia.
O mundo vive tempos de grandes incertezas, que parece tornar-se-ão permanentes. Portanto, a análise e entendimento dos desdobramentos desse imbricado jogo de variáveis controláveis e incontroláveis tornam-se de vital importância visando preparar a comunidade para as ameaças e oportunidades que vierem a apresentar-se.
* Economista e consultor financeiro da Prospering Consultoria.