Patrícia Consorte *
A pandemia influenciou drasticamente a rotina alimentar de diversas famílias, impactando principalmente as crianças. Com o fechamento das escolas e os pais trabalhando de casa, a busca por alimentos mais práticos e processados, aumentou.
Além disso, muitas acabaram ficando presas em pequenos apartamentos, sem espaço adequado para atividades físicas. As consequências dessa mudança de hábito já podem ser percebidas na saúde de muitos.
Em um estudo feito pela Unicef, cerca de 61% das famílias aumentaram o consumo de fast food e refrigerantes durante a pandemia, além de diminuir o consumo de legumes e verduras.
Por mais que muitos acreditem ser apenas uma fase, introduzir alimentos gordurosos, ultraprocessados e repletos de açúcar pode causar danos sérios à saúde das crianças, hoje e amanhã.
A compulsão alimentar é um dos riscos mais iminentes em um primeiro momento, agravado principalmente pelo excesso de tempo em frente às telas. Muitos pais deixam seus filhos assistindo desenhos em celulares, tablets ou na televisão para se distraírem, enquanto eles trabalham.
Essa forma de entretenimento é válida. Não podemos restringir totalmente o uso de telas pelas crianças, contudo, muitas acabam comendo em frente a elas, perdendo a noção da quantidade e até mesmo da qualidade dos alimentos que ingerem. Essa falta de consciência alimentar aumenta os riscos de obesidade, pressão alta e diabetes.
Infelizmente, muitos estudos que temos hoje estão defasados e não levam em consideração os problemas futuros que os maus hábitos atuais podem representar.
As crianças carregam a predisposição genética de sua família que, se já tiver doenças ou altas probabilidades, terão mais chances de serem desenvolvidas se os devidos cuidados não forem tomados desde cedo. Temos hoje o conhecimento da epigenética, ou seja, podemos ou não ativar determinados genes de acordo com nossos hábitos.
É importante ter em mente que prover uma alimentação saudável às crianças não precisa ser complicado. Evitar expô-las a alimentos ultraprocessados, que geram forte estímulo cerebral e podem contribuir para uma compulsão alimentar, já tem um impacto enorme nesse processo. Priorize sempre alimentos naturais, preparados em casa, como arroz, boas fontes de proteínas, legumes e saladas.
Muitas famílias até têm esse tipo de alimentação em sua rotina, mas acabam pecando na hora do lanche da tarde. Os sucos, biscoitos e embutidos são alguns dos mais utilizados – e mais perigosos também. Principalmente, porque a grande maioria das pessoas não tem o hábito de ler os rótulos do que consomem, para saber o que estão ingerindo.
Obviamente, mudar hábitos não é fácil, mas se dedicarmos um pouco de tempo para preparar algo mais saudável, as crianças terão uma saúde bem melhor, hoje e principalmente no futuro.
As crianças tendem a copiar e repetir os hábitos dos pais. Se colocarmos mais verduras e legumes em nossos pratos, elas também irão se interessar mais por esse tipo de alimento. E quanto mais cedo fizermos isso, melhor.
O primeiro ano da criança é o momento no qual ela será introduzida aos alimentos, deixando a amamentação exclusiva. Por estar no período de maior velocidade na curva de crescimento, é imprescindível apresentarmos alimentos com alto valor nutricional. Nessa fase, mais do que ganhar peso, a criança precisa desenvolver sua saúde, reforçando o sistema imunológico.
Logo depois, a velocidade de crescimento diminui, as crianças passam então a regular melhor a quantidade que comem, parecendo para os pais que elas estão comendo menos, sendo isso esperado. Então, os pais não devem tentar compensar isso com alimentos inadequados, querendo aumentar a quantidade ingerida pelos filhos.
Os pequenos podem apresentar alguns momentos de seletividade, evitando certos tipos de alimentos. Nesse momento, é fundamental não oferecer os alimentos doces e gordurosos de sua preferência, com a finalidade exclusiva de chegar ao peso recomendado para a idade.
É preciso exercer a maternidade e paternidade real, pensando não apenas no desenvolvimento atual, mas principalmente no futuro da criança. Quanto melhor for a alimentação na infância, mais chances de termos um adulto saudável.
Os bons hábitos são os verdadeiros protagonistas da boa saúde, sendo capazes até de evitar o aparecimento de doenças contidas na própria genética familiar. Um bom futuro depende da qualidade das escolhas feitas no presente.
* Pediatra e especialista em nutrição materno-infantil