Jair e Irene





Bem, a nossa coluna visa trazer para você, amigo leitor e leitora, um pouco de nostalgia cultural, artística. Seja contando, entrevistando, seja conversando com pessoas que deram de si para que Tatuí seja conhecida como “Capital da Música”, “Capital do Doce”, simplesmente “Cidade Ternura”, ou a nossa querida e única Tatuí.

Nesta semana, vamos co-nhecer uma dupla. Porém, de marido e mulher, que se co-nheceram pela música, através dela se casaram e constituíram uma família. Vamos conversar com os nossos amigos Jair e Irene:

Nomes completos

João Jair de Campos e Irene Trindade Moreira.

Local de nascimento

Jair – Nascido, crescido e casado em Tatuí.

Irene – Vim para cá para me casar com ele. Sou de Bernardino de Campos, São Paulo.

Onde vocês se conheceram?

Jair – Nós nos conhecemos em 1974. Foi no Tatuí Clube, onde acontecia um baile. Porém, eu já havia descoberto o endereço dela, e fomos fazer uma serenata na rua Santo Antônio, sendo que fui eu, o Luiz Curruira e o Roberto Rosendo. Ali começou a nossa história de amor.

A música exerceu alguma influência para vocês se casarem e continuarem juntos até hoje, graças a Deus?

Jair – Sim, eu cantava no “Samba Show”, ao lado de Pretanha (timba), José Carlos Severino (violão sete cordas), Norberto “Conde” (violão), Geraldinho (afoxê), Jair (voz e violão) e o Braz, que era empresário. Nós fomos fazer uma serenata para ela. Ela nos recolheu e ofereceu um jantar na madrugada. E ali ela me pegou pelo estômago.

Irene – É, a música, sem sombra de dúvida, teve um papel muito importante, pois ela nos aproximou. As nossas vozes se casaram, e a cada apresentação musical foi mais e mais união, e continua sendo!

Como era a situação no palco, durante uma apresentação, se alguém olhasse para Irene de forma diferente, como você reagia, Jair? E você, Irene, se ocorresse o mesmo em relação ao Jair, como era a sua reação?

Jair – Poxa, a gente enfrentava isso numa boa, pois estávamos no palco, e tudo que vinha tínhamos que saber como proceder. Às vezes, alguns homens falavam: “A cantora é muito bonita”, e outras coisas mais. Eu tinha que me conter e manter a linha para evitar problemas. Mas sempre havia um grande respeito para co-nosco. Eram outros tempos, e a amizade prevalecia.

Irene – Eu tinha muito ciúmes, sim, mas é que a mulherada era muito atrevida. Certa vez, eu percebi uma mulher olhando de uma forma diferente para o Jair, e notei que ela foi ao banheiro. Não pensei duas vezes, entrei no banheiro e falei com ela: “Você quer ele? Se ele te quiser, tudo bem. Mas se ele não te quiser, deixe ele em paz”. E acabamos nos tornando amigas, numa boa.

Jair, eu me lembro de que nós fomos colegas no Orfeão Nacif Farah, da escola “Barão de Suruí”, e quem dirigia era a professora Aline e o professor José dos Santos, pois nós dois éramos tenores. Você se recorda disso, e em que ano foi?

Jair – Perfeitamente, eu estudava à noite no “Barão de Suruí” e a Aline, que era professora do orfeão, me convidou. Eu cantava junto com você e com o Rosendo. Eu saía do serviço e ia para os ensaios na sala do anfiteatro da escola. Bons tempos! Quantas viagens para cantar em São Paulo, Campinas e noutras cidades. E tudo isso ocorreu entre 1969 e 1971.

Em que ano vocês começaram a cantar juntos?

Irene – Nos casamos em 1975 e um dia estávamos em nossa casa, junto com os seresteiros Noel Rudi, Zé Fiuza e um senhor chamado Osmil Martins. Ele me ensinou a cantar a música “Casinha Branca”. Eu não conhecia nada de seresta, pois o meu repertório era baseado em boleros, tangos, e assim entrei para a seresta e comecei a achá-la maravilhosa. Assim começamos a cantar em dupla, pois, como a minha voz é de soprano e o Jair tem a voz de tenor, dava o dueto certo e afinado.

E nós cantávamos muito em churrascarias, bares, restaurantes, e até fomos cantar no “Terraço Itália”, um restaurante muito famoso de São Paulo. No repertório, tínhamos muitas músicas “dor de cotovelo”, músicas da Maísa, e Cascatinha e Inhana, nas quais o nosso dueto de vozes era perfeito. Era uma época romântica.

Também tivemos programa na Rádio Notícias, no tempo que ela era na rua 7 de Abril, ao lado da antiga usina de leite Vigor, e onde as pessoas ligavam, pediam as músicas e nós cantávamos ao vivo, atendendo aos pedidos dos ouvintes. Que saudade!

Eu me lembro de vocês cantando em vários shows no tempo da Rádio Notícias, na Concha Acústica, em festas juninas, e quem apresentava era o inesquecível Teixeira “O Coronel do Sertão”. Soube que vocês gravaram uma música dele, chamada “Nhaninha Cega”, que foi uma senhora muito caridosa que viveu em Tatuí por volta de 1818 e que, pela história, tinha um coração muito grande. Conte-nos um pouco a respeito disso.

Jair – Foi em 1981. A história é mais ou menos assim: o Teixeira nos convidou para gravarmos essa música e mais três que compõem o compacto duplo com quatro músicas, sendo duas de cada lado. E começamos a ensaiar a música, fizemos o arranjo dela, pois conheço muito essa história. A minha mãe contava-me sobre os milagres que ela realizou.

O professor José dos Santos é bisneto dela e foi entrevistado. Inclusive, eu tenho nos meus arquivos uma cópia da revista “Aldeia Global”, de novembro de 1976 (páginas 6 a 12), na qual aparecem muitos relatos sobre a vida de Nhaninha, a devoção religiosa, humildade, resignação, desprendimento pelos bens materiais e apego aos valores morais e espirituais.

No texto, comenta-se que ela tinha dons como precognição, pois antevia feitos e coisas. Também ela tinha crises de clariaudiência, que é a faculdade que consiste na audição com nitidez de vo-zes do mundo espiritual.

Tendo em vista essas qualidades de Nhaninha Cega, a senhora Ana Cesar de Camargo, pessoa dotada de nobres virtudes cristãs, fez uma campanha para construção de uma capela em homenagem a ela no cemitério Cristo Rei, em Tatuí. Várias pessoas colaboraram para aquela construção.

E, assim, gravamos no disco as músicas: “Nhaninha Cega” (Teixeira), “Maria Tereza” (de nossa autoria) “Rei da Invernada” (Teixeira e Rosendo) e “O Menino do Cesto” (Teixeira).

Quando foi o auge da carreira de vocês?

Jair – Bem, o auge de Jair e Irene foi de 1975 até 1983, quando então fomos embora para São Paulo para “cantar na noite”. E ficamos muito tempo cantando por lá. E aqui em Tatuí, nessa época, nasceu a outra dupla: Jair e Duda, e isso, às vezes, gerava certa confusão por causa dos nomes.

Em 1986, voltamos para Tatuí. Nós continuamos cantando em restaurantes, no Jandir, no Renato Pasqualote, em clubes e em outros vários lugares.

Tem algum show ou evento que marcou a carreira de vocês?

Jair e Irene – Foi um show em São Paulo, no Terraço Itália, onde nós cantamos para muita gente. Já em Tatuí, foram muitos eventos na Concha Acústica, festivais de música sertaneja e o “Festival Arizona”, em Sorocaba, que, no meio de milhares de duplas de todo o Estado de São Paulo, nós ganhamos em segundo lugar. Eram 5.000 pessoas nos assistindo. Foi um momento inesquecível.

Jair – Ah! Nós, em breve, vamos cantar no programa “Som Brasil”, do Rolando Boldrin. Daí, eu comunico a você para avisar o povo de Tatuí. Valeu!

Nhaninha Cega

Tu foste na vida

Exemplo de amor,

Ficaste ceguinha

Mas Deus, Criador.

Te deu Luz Divina,

Foi teu protetor,

Enfermos curastes

Com as mãos do Senhor.

Nhaninha Cega

Santinha de Tatuí

Nhaninha Cega

Eu clamo por ti.

Na tua Capela

Eu venho rezar,,

Das doenças que tenho

Tu vais me curar.

A paz que procuro

Eu vou encontrar.

O amor que desejo

Sei que vais me dar.