É preciso estar muito compenetrado e comprometido com os alfarrábios do nada saudoso Joseph Goebbels para não se arrepiar quando um evento a se divulgar como “antifascista” e “pela democracia” é vetado pela Fundação Nacional das Artes, a Funarte – órgão máximo da política cultural do país.
Sem esforço – ao feitio de quem consome fake news no “Zap” sem qualquer questionamento, simplesmente para não ter trabalho de ler jornal ou resgatar os livros de história -, é bem razoável concluir que fascismo e ditadura de holocausto são critérios de qualificação para se produzir arte com o incentivo do governo no Brasil…
Pelo mesmo raciocínio, sucede-se a alarmante e inacreditável nítida simpatia pelas crenças aglutinadas simbolicamente em torno da sombria suástica – ainda que, no Brasil da atualidade, esses princípios extremistas estejam encobertos por um falso discurso de religiosidade e “família”.
Bom, vale pensar que tipo de fé e família seriam essas? Em questão, a defenderem o fim da democracia e, por extensão, compactuando com aquilo que ficou marcado na história pelo extermínio de judeus, ciganos, homossexuais e demais grupos considerados inferiores – por eles, os “superiores arianos”, tal hoje parecem se considerar algumas castas do país, segmentadas no que poderiam ser identificadas, sim, como “bandas podres”, sejam fardadas ou não.
Interessante – hilário, até! – é o fato de que, pela avaliação do genocida Adolph e seus milicianos, certamente nós, os brasileiros, seríamos considerados verdadeiros vira-latas, tal nossa miscigenação, e, portanto, levados ao sono eterno por banho de gás sem qualquer cerimônia.
A despeito disso, em mais uma visão sobrenatural pela desfaçatez do escracho, o país testemunha suas maiores autoridades abraçadas e tirando fotos em riso (sem máscara, claro) com uma expoente do neonazismo alemão, a deputada Beatrix von Storch, vice-presidente do partido de extrema-direita “Alternativa para a Alemanha”.
Parece, como se diz, surreal. Mas, não! É o Brasil de 2021 – rumo a 2022, quando já nem se sabe se haverá eleições, segundo figuras a ameaçar o Congresso (e a própria população) porque “têm armas”!
Aliás, ressalte-se: armas compradas com o dinheiro público – ou seja, seu, do seu vizinho, de todos nós, que pagamos os impostos, então, para armar aqueles que deveriam defender o país, não nos ameaçar e a nossos representantes, por pior que eventualmente sejam estes.
Lembrando que todos os parlamentares tiveram os nossos votos para chegarem ao Congresso, seria bem menos ruim considerar a ideia de se dar melhor ao trabalho para a escolha de nossos representantes que, simplesmente, abrir mão desse direito, deixando à nova milícia simpática ao fascismo que o faça por imposição arbitrária e apenas para figuração parlamentar.
Esse modelo, também vale lembrar, é o mesmo tão criticado pelos extremistas nacionais quanto à Venezuela, por exemplo, onde não cai o governo, simplesmente, porque mantém-se sustentado pelos que lá também “carregam as armas”.
Além, claro, por manter-lhes na gandola um arsenal de cargos governamentais e privilégios – prova de que, diante do alvo financeiro e das mordomias, os arsenais servem para atirar à direita ou à esquerda, tanto faz!
Retomando a seara cultural, seria coincidência que os aparentes ídolos dos candidatos a golpistas do Brasil atual também odiavam a cultura democrática e antifascista? Ah!… Será?
Queimar projetos artísticos de cunho social, agregador e libertário teria algo a ver com incinerar livros em praça pública? Ah!… Será? Vai que não…
Na dúvida quanto às similaridades e propósitos nazifascistas (só possível a quem ainda crê ser familiar e ato de fé todos os preconceitos possíveis e a indiferença pela morte – senão o apreço), chega-se à obrigação, “moral e cívica”, de defesa da cultura como “arma” – está, sim, positiva e fundamental – contra a derrocada civilizacional vivida pelo Brasil.
Não fosse a cultura tão importante e impactante, não seria ela tão obliterada pelo extremismo fanático, assim como ocorre, não por acaso, também com a Educação e a Ciência.
Por tudo isto, é ótimo e digno de todo o apoio uma iniciativa promovida na cidade: o Manifesto Cultural de Tatuí. A partir do Mart (Movimento Artístico de Tatuí), ele expôs uma série de demandas a curto, médio e longo prazo para atender ao setor cultural do município.
O manifesto teve leitura na noite de segunda-feira, 26, em reunião virtual do Conselho Municipal de Cultura, contendo os principais pontos levantados em três encontros do Fórum Permanente de Políticas Públicas para Tatuí, promovido pelo Movimento Popular Práxis, com apoio do próprio conselho, no início de junho.
A intenção do manifesto é de que o poder público assuma a responsabilidade de auxiliar trabalhadores da cultura afetados pela pandemia.
O documento evidencia que o setor artístico contribui diretamente com os títulos tatuianos de “Capital da Música” e MIT (Município de Interesse Turístico), embora venha a ser um dos últimos a voltar à normalidade após o período pandêmico.
O manifesto é composto por 19 proposições. Entre elas, o Mart pede a criação de uma lei de fomento para as artes da cidade com fundo direto, atendendo às especificidades de todos os segmentos, além de editais de apoio à cultura e aos trabalhadores “das mais variadas frentes de atuação artística, com participação da classe na elaboração”.
Os artistas pedem a revisão e alteração do Sistema Municipal de Cultura, do Fundo Municipal de Cultura e da Lei do Conselho Municipal de Cultura, observando a inclusão e pertinência para a criação da lei de fomento.
Entre outras observações, busca-se a oferta de espaços públicos para as manifestações artísticas, com melhorias estruturais nos existentes e a criação de novas estruturas teatrais e de espaços físicos para atender à demanda cultural, como praças para as artes e ruas fechadas aos finais de semana.
A realização de uma “campanha informativa sobre quem são os artistas locais, com ampla exposição dos seus trabalhos e o fortalecimento da narrativa de que são trabalhadores que movimentam a economia da cidade, colaborando com a segurança pública, saúde, educação e juventude”, é mais um dos pedidos.
O Mart também solicita: inserção de cursos de arte na rede municipal de ensino; elaboração de uma oficina que recupere e registre a história artística da cidade; criação de programas culturais para o turismo e redes públicas; e manutenção de feiras de artesanato em todos os finais de semana.
Ainda são pedidos do movimento: a criação de uma biblioteca de cultura negra; valorização da cultura popular local, através de editais específicos, mostras, festivais e premiações por mérito histórico; e promoção e registro de ações que garantam a formação de público e de novos artistas.
Os integrantes ainda desejam a formação de uma comissão, composta por artistas, sociedade civil e poder público, para rever a legislação que limita os horários para apresentações artísticas com música ao vivo.
Todas as propostas, naturalmente como o próprio movimento reconhece, carecem de debate e consenso público – o que também é ótimo, pois valoriza justamente aquilo que o país mais precisará no pós-pandemia: a democracia. Além, claro, de consenso, paz, educação, informação e, sem censura neonazista, muita, muita arte!