Falta de controle





Não existir um programa verdadeiro e contundente de controle de natalidade no Brasil, além de absurdo, em determinados momentos e diante de algumas situações, extrapola o irresponsável para alcançar a condição de profunda maldade.

Sem qualquer desrespeito às crenças religiosas, cuja força política impede o governo de efetivar a educação sexual de maneira clara e concreta, a realidade é que, como se diz, “botar filho no mundo pra sofrer” deveria ser algo reconhecido como uma espécie de crime.

Como tal, por sua vez, precisaria ser combatido não apenas na esfera de governo, mas, inclusive, pelas próprias religiões, as quais costumam apiedar-se frente ao sofrimento.

Os dogmas não deveriam sobrepor-se à dor, tampouco à ideia irreal de que a imensa maioria das pessoas leva a sério a castidade antes do casamento, ou mesmo que, após este, só faz sexo por procriação.

A dor acontece quando, involuntariamente e pela falta de informação – de educação! -, o casal, quase sempre jovem, não se previne e a mulher acaba grávida.

Essa dor pode ser, apenas, “de cabeça”, num primeiro momento, porém, resultando em alegria em seguida. Isto, contudo, somente quando envolve pessoas e respectivas famílias estruturadas, emocional e financeiramente.

Caso contrário, lá se vai a oportunidade de estudo do jovem casal (ou somente dela), de busca de um trabalho melhor, enfim, de conquistas pessoais, postas de lado para se criar minimamente bem a criança.

Claro, o sacrifício pode ficar para os avós, aos quais é imposta a renovada condição de pais. O pior, por sua vez, é quando falta tudo: família, educação, estrutura emocional e financeira, responsabilidade e, o mais grave, sanidade.

Aí, a maior dor é sentida pelas crianças, desamparadas e, já desde a infância, condenadas a vidas miseráveis, senão fadadas a repetir os mesmos erros dos pais. Este ciclo desumano precisa ser quebrado.

Para se ter ideia de um drama assim, basta observar o ocorrido em Tatuí nesta semana, quando crianças tiveram de ser resgatadas pelo Conselho Tutelar.

Duas crianças – de 6 e 11 anos – foram encontradas pelo CT abandonadas em uma residência na vila Dr. Laurindo. O flagrante de abandono de incapaz ocorreu na tarde de domingo, 26, após denúncia anônima.

Uma conselheira chamou a Guarda Civil Municipal para acompanhar a diligência. Conforme ela, os menores são acompanhados pelo órgão há cinco anos. Eles passaram a receber atendimento por conta da prisão do pai, de 43 anos, que está detido até o momento.

Na ocasião da prisão dele, os filhos menores (cinco, no total) ficaram sob os cuidados da mãe, de 44 anos. Ocorre que a mãe também foi presa e cumpre pena na penitenciária de Santana. Com isso, a guarda dos menores passou a um dos irmãos mais velhos, de 25 anos.

A conselheira informou que o irmão também acabou preso e permanece no Centro de Prisão Provisória de Porto Feliz. Por essa razão, os menores ficaram sob a custódia, provisoriamente, de outro irmão, de 23 anos.

No entanto, o conselho recebeu denúncia de que o responsável não estava cuidando das crianças. Conforme a conselheira, os menores permaneciam por muito tempo “sem qualquer supervisão e cuidados indispensáveis à segurança”.

No local, ela encontrou as duas crianças, que contaram que estavam “se alimentando havia três dias apenas com bolachas”. Também relataram que permaneciam sozinhas na maior parte do tempo.

Disseram, ainda, que os dois irmãos adolescentes, de 13 e 14 anos, estavam na residência de uma vizinha e que a outra criança, de nove anos, encontrava-se num sítio, sob os cuidados da mãe de um dos irmãos por parte de pai.

Em virtude da situação, a conselheira decidiu abrigá-las na Casa de Acolhimento. Também informou o fato à Vara da Infância e da Juventude.

Na tarde de segunda-feira, 27, outras sete crianças foram encontradas pela PM em situação de abandono. De acordo com os militares, a equipe que atendeu à ocorrência aguardou a chegada das responsáveis por três horas.

As duas mulheres, de 25 e 28 anos, receberam voz de prisão. Elas pagaram fiança e vão responder pelo crime em liberdade. Segundo a PM, elas teriam dito que deixaram os menores no local – não informado – para fazer compras. As crianças, com idades entre oito e dez anos, foram abrigadas.

São tragédias que deixam pelo menos mais uma questão seríssima: o estado – esse que não resolve problemas básicos, como, por exemplo, de saúde e segurança – tem competência para (bem) educar crianças em abrigos?

Que fazer, então, em meio à covardia política, à intransigência, à insensibilidade, ao desamparo e à falta de perspectiva? Nada? Não! Além de chorar por um triste futuro, pelo menos dá pra rezar, orar…