Da reportagem
O número de denúncias falsas levadas ao Conselho Tutelar de Tatuí – serviço que atende casos de violação dos direitos de crianças e adolescentes – chegou a 40% do total das ocorrências atendidas pelo órgão neste ano.
Levantamento apresentado a O Progresso aponta que pelo menos quatro em cada dez denúncias recebidas entre janeiro e setembro não tinham procedência e não geraram inquéritos policiais.
Segundo o conselheiro Wilian Alexandre Nunes da Silva, todas as denúncias são investigadas e, por isso, “as informações falsas acabam atrapalhando o atendimento, gerando demandas desnecessárias e atrasando a identificação de vítimas verdadeiras”.
“Muitos casos entraram na questão da guarda das crianças. A família queria ficar com a criança, fez uma denúncia grave sobre quem tinha a tutela e, quando a gente chegava ao local, não era nada daquilo. Isso prejudica muito, porque a gente acaba requisitando serviços e perdendo tempo”, argumentou o conselheiro.
Conforme Silva, outra situação comum é quando alguém faz a denúncia sem conhecer bem a situação da criança ou do adolescente, por deduzir estar ocorrendo algum tipo de uma violência. Neste caso, o conselheiro orienta que se procure confirmar o fato antes de repassar a informação ao conselho.
Em todo caso, o conselheiro ressalta ser importante denunciar. Ele aponta a denúncia anônima como a principal ferramenta para o Conselho Tutelar e para o CMDCA (Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente) intervir em casos de violência física ou negligência.
Segundo ele, com o isolamento social devido à pandemia do novo coronavírus e o consequente aumento do número de casos de violência contra a criança e o adolescente, vizinhos, familiares e toda a sociedade devem estar atentos.
Um estudo informal feito pelo órgão aponta aumento também de 40%, em média, no índice de denúncias e atendimentos realizados pelo conselho nos últimos meses em relação ao mesmo período de 2019.
O número inclui chamadas recebidas pelo Conselho Tutelar através dos telefones do disque-denúncia (10% dos casos), no plantão de atendimento (80%) e por meio da rede, composta pelas secretarias municipais da Saúde e da Educação, pela Assistência Social e pelos órgãos de segurança (10%).
“Todos os canais são de denúncia anônima, justamente, para ser uma ‘porta aberta’. Assim, as pessoas não ficam expostas e não precisam ter medo de retaliação. Este medo de denunciar deve acabar, pois isso deixa as crianças mais vulneráveis”, acrescentou o conselheiro.
Para Silva, a atenção ainda deve ser redobrada por conta da suspensão das aulas, isso porque os profissionais de escolas e creches costumam ser aliados e representam boa parte dos “colaboradores”, ao denunciarem casos observando marcas e ou alterações comportamentais das crianças.
“Sem a escola nos ajudando, precisamos que toda a sociedade se mobilize e denuncie. Por isso, por diversas vezes, distribuímos cartazes e incentivamos a denúncia. O principal benefício é proteger as crianças e os adolescentes, além de garantir a preservação dos direitos”, enfatizou o conselheiro.
A denúncia pode ser feita nas delegacias, pelo plantão do Conselho Tutelar, pelo (15) 99677-0453 e através de ligação gratuita para o “Disque 100” – serviço de proteção de crianças e adolescentes com foco em violência sexual.
O Disque 100 é vinculado ao Programa Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, da Secretaria de Direitos Humanos, do governo federal.
O serviço funciona diariamente das 8h às 22h, inclusive nos fins de semana e feriados, e acolhe denúncias de violações de direitos de toda a população, especialmente quanto aos grupos sociais considerados vulneráveis, como crianças e adolescentes, em situação de rua, idosos, deficientes e população LGBTT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais).
As denúncias são analisadas e encaminhadas aos órgãos de proteção, defesa e responsabilização, de acordo com a competência e as atribuições específicas, priorizando o Conselho Tutelar como porta de entrada (nas situações de crianças e adolescentes), no prazo de 24 horas, mantendo em sigilo a identidade do denunciante.
“Quem denuncia está exercendo seu papel perante a sociedade de cuidar desta criança ou deste adolescente – mesmo que ela não seja da sua família ou do seu convívio. Se a pessoa presencia um direito sendo violado, o Conselho deve ser acionado”, completou o conselheiro.
Além disso, Silva destaca que a principal função do CT é a proteção e a garantia de preservação dos direitos das crianças e dos adolescentes, conforme estabelecido pelo ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente).
Segundo ele, além de agir sempre que os direitos forem ameaçados ou violados, faz parte da função atender e aconselhar pais ou responsáveis e requisitar serviços públicos nas áreas de saúde, educação, social, previdência, trabalho e segurança, ou representação judiciária.
“Às vezes, as pessoas acham que o conselho serve para tirar a criança das mães e punir os pais e responsáveis. Nós, do conselho, estamos tentando, aos poucos, desconstruir essa ideia. Nossa intenção é que as crianças e as famílias enxerguem o conselho como um aliado”, concluiu.