No ano em que o Conservatório de Tatuí completa 60 anos, cabe uma breve avaliação do estágio em que ele se encontra, assim como a situação da escola em âmbito do Estado de São Paulo e do Brasil, bem como paralelos com alguns conservatórios do mundo, pontos fundamentais a este breve raciocínio.
O Brasil tem uma tradição equivocada de concentrar tudo, especialmente seus melhores equipamentos culturais, nas grandes metrópoles e capitais, coisa que vem da época colonial, passa pelo Império e suas capitais até a República, começando em Salvador, instalando-se no Rio de Janeiro por longo tempo até 1960, quando se instalou em Brasília. Por destino ou inércia, a grande estrutura cultural tem raízes sólidas na antiga capital do Império e da República, o Rio de Janeiro, e em São Paulo, hoje a mais privilegiada. Mas o que acontece nos outros países? O Conservatório de Oberlin, uma importante instituição dos EUA, aos 180 anos de idade, fica situado na pequena cidade do mesmo nome, com 8.000 habitantes. Seus excelentes professores vêm de centros importantes, principalmente da afamada Sinfônica da Chicago. O respeitado Conservatório de Genebra, na Suíça, antigo como o anterior, fica em uma cidade de 194 mil habitantes. Por sua vez, na França, o Conservatório de Lyon, cidade com pouco mais de 400 mil habitantes (bem menor do que Sorocaba), também perfila entre os melhores. Nenhum deles fica em capital, e, no caso de Oberlin, trata-se de uma cidade bastante pequena, mesmo para os padrões do interior paulista. O Conservatório em Tatuí é uma gema de ouro onde deveria estar.
Nosso maestro Eleazar de Carvalho disse: “Uma orquestra não se faz em dez anos, mas em cem”. E, como andam lado a lado orquestras e conservatórios, ao bem ultrapassar a metade de um século já podemos vislumbrar a consistência do Conservatório de Tatuí do outro lado do pêndulo, já de vento em popa rumo aos cem anos simbolicamente preconizados por Eleazar, caminho para o porvir que continuará frutificando, hoje e amanhã, por gerações e gerações.
É preciso boas instalações, e não é uma luta que se resolve de uma vez. Bons instrumentos: muitos chegaram e outros tantos estarão a caminho. Manutenção, ferramentas para luteria, boas madeiras para trabalho, condições físicas para o estudo e a prática das artes cênicas. Tudo com acessibilidade – fora o que é antigo e arquitetonicamente impossível de mudar. Bons materiais de estudo, mais locais para apresentação – além do Teatro “Procópio Ferreira” e o Salão “Villa-Lobos”, há o novo espaço com o piano Rönish no salão do chamado anexo 3, e a bela sala de câmara na Unidade 2.
Muito mais relevante do que isso, existe suporte ao trabalho dos professores e instrutores, em geral, pois são eles a máquina, com seu conhecimento e dedicação missionária, cujo motor impulsiona e faz do Conservatório uma instituição com sentido de permanente evolução. Some-se a esse sólido corpo docente uma equipe de produção elogiada por artistas brasileiros e estrangeiros, assim como a área de comunicação e secretaria, entre outras, que se superam a cada dia, e os servidores administrativos, de suporte, portaria e limpeza, que nos recebem sempre com um sorriso. É preciso controle e disciplina – afinal, trata-se de uma organização do porte de uma empresa de 300 funcionários, com todas as suas virtudes e mazelas.
Por fim, mas claro que não por último, o mais importante: aqueles por cujo ingresso sempre aguardamos com ansiedade, cuja qualidade para disputar uma vaga de aluno tem sido visivelmente melhor nos últimos anos, o que inspira e impulsiona a todos. Como nos conservatórios do mundo citados e em todos os outros do mundo, as disciplinas acadêmicas são organizadas em quadros e currículos programáticos bem elaborados, etapas semestrais a serem vencidas – sim, o mundo da música passa por aí -, e uma preparação técnica aliada ao estímulo à melhor execução. O Conservatório é o meio, os alunos são o grande objetivo do ensino.
Para 2014, na melhor idade, recebemos da Secretaria de Cultura do Estado um aporte especial que nos possibilitará a maior temporada de todos os tempos – os Encontros Internacionais (de instrumentos, performance histórica e luteria) acontecerão em dobro: ao invés dos tradicionais cinco por ano, serão dez, movimentando uma estrutura de pessoal compatível com grandes festivais e casas de concertos e de shows. A concorrida área de MPB-Jazz terá oportunidade de mostrar o que tem de melhor, ao mesmo tempo em que trará grandes oportunidades para seus alunos. Não cabe detalhar e contabilizar números, e sim parâmetros de qualidade: Certame da Canção (do Festival de MPB), Painel Instrumental, Fetesp, Cururu, e concursos.
É raro no Brasil uma escola de música atingir 60 anos, ainda mais gozando de plena saúde e disposição, mesmo porque assim deverá prosseguir como nossas irmãs europeias e norte-americanas, além do século, e muito além de nós, que, braços dados, participamos de cada etapa, sempre fundamental à sua consolidação de uma escola modelo. Por isso mesmo, cidades do Estado de São Paulo e também de outros Estados têm vindo pedir orientação para novas ou existentes escolas de música de todos os tipos e dimensões, apoio que a equipe do Conservatório empresta sempre graciosamente, pois que isto é mais do que o espírito republicano, é missão mesmo dos que vêm na música parte fundamental da cultura de um povo e indissociável de toda a civilização. Parabéns, Conservatório de Tatuí!