Da reportagem
Mulheres transexuais e travestis vítimas de violência doméstica, familiar ou crimes contra a dignidade sexual, já podem procurar a Delegacia de Defesa da Mulher para registrar ocorrência e receber atendimento.
Nova determinação divulgada pela Polícia Civil define que o sexo biológico não interferirá para que as vítimas sejam atendidas por essas unidades especializadas – prevendo, assim, o acolhimento a mulheres transgênero, transexuais e travestis, levando em conta a identidade de gênero.
A determinação foi publicada no Diário Oficial do estado na quinta-feira da semana passada, 13, e oficializa a reformulação do decreto 29.981, de 1º de junho de 1989, que estabelece atribuições e competências dessas unidades especializadas.
Conforme o delegado titular do município, José Luiz Teixeira, a alteração do decreto ocorreu especificamente no artigo primeiro, estabelecendo que as DDMs investiguem crimes praticados “contra pessoas com identidade de gênero feminino”.
“Isso significa que a pessoa que se defina como mulher poderá ser atendida pela DDM independe do sexo que ela tenha nascido. É uma questão de dignidade humana e de reconhecimento a esta população”, observou o delegado.
Antes da publicação da medida, transexuais e travestis não eram impedidas de receber atendimento nas unidades especializadas, entretanto, segundo Teixeira, a reformulação do decreto traz “mais segurança e garantias a este público no momento de registrar o boletim de ocorrência”.
Teixeira ponderou que, antes da publicação do decreto, as opiniões eram divididas e apenas uma parte das DDMs do estado atendia às vítimas pela identidade de gênero.
“Às vezes, juízas e até delegadas achavam que o sexo biológico deveria ser levado em conta e que essas pessoas deveriam ser atendidas em delegacias comuns”, comentou o delegado.
Para ele, o decreto veio “colocar uma luz” sobre o assunto e orientar as autoridades à frente das delegacias especializadas, levando a regulamentação e obrigatoriedade do atendimento.
A medida vale para todas as unidades especializadas do território paulista, inclusive para a Delegacia de Defesa da Mulher de Tatuí – que, conforme o delegado, já prestava esse tipo de atendimento.
“Já tínhamos delegadas com o bom senso de reconhecer a identificação da vítima pelo gênero, mas não era uma atribuição legal direta. Com a medida da PC, todas as DDMs devem atender essas vítimas”, acentuou o delegado.
Teixeira disse acreditar que, com a divulgação do decreto da PC, as mulheres transexuais e travestis se sentirão mais à vontade para procurar ajuda na DDM, por se tratar em uma delegacia especializada.
“A Delegacia da Mulher é mais bem estruturada para receber as vítimas. Lá, as atendentes, escrivãs e investigadoras são preparadas para acolher a denúncia e o ambiente também é mais confortável”, argumentou o delegado.
Apesar de apontar a DDM como o local indicado para o registro de ocorrência em casos de violência doméstica e familiar, Teixeira destacou ter um plantão policial 24 horas, preparado para atender as vítimas.
Segundo ele, como a DDM funciona em horário comercial (de segunda a sexta, da 8h às 18h), é o plantão da Delegacia Central que fica responsável pela recepção das vítimas no período noturno, aos finais de semana e feriados.
“Quem estiver aqui no plantão vai recepcionar a vítima e registrar ocorrência. Nós vamos fazer todo o serviço necessário e, depois, encaminhamos o inquérito para que a apuração seja materializada na DDM”, explicou o delegado.
Outra mudança
No artigo 1º do decreto também impõe outra mudança em relação à competência das DDMs. Agora, essas unidades especializadas passam a atender e investigar apenas “infrações penais relativas à violência doméstica ou familiar e infrações contra a dignidade sexual”.
Antes, casos como briga entre vizinhas eram levadas à delegacia por ter mulheres envolvidas. Com a medida, essas ocorrências passam a ser tratadas como desentendimento comum em qualquer delegacia.
Teixeira informou que, na cidade, a mulher pode continuar procurando a DDM, mesmo nestes casos. Lá, a vítima será ouvida, o boletim de ocorrência é registrado e, depois, encaminhado à delegacia do município para a realização do inquérito policial.
“A mulher não vai mais precisar ser ouvida aqui no plantão – o que, às vezes, era um fator de constrangimento, pois aqui tem pessoas presas por droga, assaltantes etc. Na DDM, ela vai ser recepcionada e receber atendimento especializado, mas não será mais atribuição da DDM investigar este tipo de crime”, afirmou o delegado.
Além disso, o decreto determina que todas as ocorrências praticadas contra a dignidade sexual de crianças (de 0 a 12 anos incompletos) e adolescentes (de 13 a 18 anos incompletos), do sexo masculino, vítimas de crimes contra a dignidade sexual, devem ser encaminhados à DDM.
“Nos crimes contra a dignidade sexual, quem vai ouvir e apurar a ocorrência é a DDM. No entanto, furtos, tráfico de drogas, roubos e outros tipos envolvendo crianças e adolescentes, a investigação continua sendo atribuição da Delegacia Central”, concluiu o delegado.