Da reportagem
A Patrulha da Paz foi lançada oficialmente na quarta-feira, 19, em cerimônia no paço municipal. O programa inédito tem objetivo dar apoio à mulher vítima de violência doméstica e foi anunciado como mais um instrumento na busca pela redução dos índices de agressão e feminicídio.
O programa é resultado de parceria entre o Poder Judiciário e a prefeitura, que funcionará por meio da Guarda Civil Municipal. A ação foi desenvolvida nos moldes preconizados pela lei Maria da Penha (11.340/2006) – uma das principais referências no enfrentamento à violência doméstica –, em vigor desde 7 de agosto de 2006.
A solenidade também marcou o lançamento do aplicativo da Patrulha da Paz e do “Botão de Pânico”, desenvolvido para que as mulheres com medida protetiva possam acionar socorro com mais rapidez (reportagens nesta edição).
Estiveram presentes autoridades representantes dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, secretários, vereadores, diretores municipais, assessores, agentes de segurança e membros do CMDM (Conselho Municipal dos Direitos da Mulher).
A mesa de honra esteve formada pela prefeita Maria José Vieira de Camargo; pelo vereador Fábio Menezes, representando a Câmara; pela desembargadora da 3ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, Antonia Regina Tancini Pestana; pelo juiz da Vara de Infância e Juventude e do Juizado Especial Cível e Criminal, Marcelo Nalesso Salmaso; pelo promotor de Justiça Carlos Eduardo Pozzi; e pela chefe de gabinete da desembargadora do TRT-15, Naira Fulini Brasil.
O foco do programa, conforme anunciado no evento, é buscar a redução dos índices de agressão contra a mulher e a garantia de cumprimento às medidas protetivas concedidas às vítimas de violência doméstica e familiar.
O projeto prevê rondas específicas, além de suporte aos programas sociais já existentes no Creas (Centro de Referência Especializado de Assistência Social), Justiça Restaurativa, Polícia Civil e CMDM (Conselho Municipal dos Direitos da Mulher), por meio de parceria entre Judiciário, prefeitura e GCM.
Com o programa, a partir das notificações de violência junto ao Judiciário local e da emissão das medidas protetivas, é feito um cadastro da vítima e do agressor, por meio da Justiça Restaurativa, e os guardas que atuam na patrulha passam a fiscalizar eventuais descumprimentos das ordens expedidas.
Entre as principais medidas protetivas urgentes estabelecidas pela lei Maria da Penha, estão o afastamento do agressor do lar ou local de convivência com a vítima e as proibições de contato e aproximação entre vítima e agressor.
A legislação prevê até a prisão preventiva como meio de assegurar o cumprimento da ordem judicial.
Em discurso, Salmaso – que coordena as ações da Justiça Restaurativa – falou sobre o desenvolvimento do programa, destacando o envolvimento interinstitucional e intersetorial na criação e implantação do projeto.
“Temos aqui o Poder Executivo, o Judiciário, o Legislativo, a sociedade civil organizada, a Polícia Militar, autoridades civis, todos juntos dialogando e alinhando em prol do bem comum, e isso é de grande importância para fortificar as ações do programa”, frisou o juiz.
Salmaso contou ter acompanhado todo o processo de elaboração da iniciativa da GCM, e destacou o trabalho de planejamento e articulação de todos os setores para a formação do programa e das ferramentas da Patrulha da Paz.
O Núcleo de Justiça Restaurativa promoveu capacitação para todos os guardas municipais (mais de 150 homens e mulheres) com um curso de qualificação que abordou os temas “Justiça Restaurativa”, “cultura de paz” e “violência doméstica”.
“Um trabalho como este, é claro, não nasce da noite para o dia. Quando as coisas acontecem no atropelo, não funcionam. Mas, este projeto eu posso garantir que foi gestado, pensado e articulado”, assegurou o juiz.
“A expectativa, a partir de então, é de se obter resultados fantásticos no enfrentamento da violência doméstica e grande impacto social em termos de proteção à mulher vítima de violência”, ressaltou Salmaso.
O magistrado ainda comentou sobre o número de casos de denúncias de agressão contra mulheres no país, apontando que, apesar de crescente, pode não representar aumento de vítimas, mas sim de registros de ocorrências devido aos movimentos que incentivam a denúncia.
“Muitos movimentos vêm sendo feitos no sentido de lidar com esse problema. O doutor Pozzi, promotor da Comarca, tem sido uma das referências neste tema. Ele, inclusive, tem feito muitas palestras neste movimento do fortalecimento da vítima e do enfrentamento da questão da violência doméstica”, apontou Salmaso.
Ele anunciou que, com o lançamento da Patrulha da Paz, será possível aumentar a abrangência dos serviços do Centro de Apoio à Vítima de Violência e pontuou mudanças ocorridas no atendimento à mulher agredida (reportagem nesta edição).
Para finalizar, o juiz agradeceu as pessoas envolvidas na criação da Patrulha da Paz, elencando algumas que contribuíram ao longo do desenvolvimento da iniciativa, com a elaboração do programa e dando subsídios à ação.
“Só tenho a agradecer o trabalho de todas essas pessoas envolvidas – que também resultaram anteriormente, na implantação da Justiça Restaurativa – e dizer que todos estão trabalhando em prol de uma sociedade mais justa e humana”, finalizou.
Pozzi parabenizou os envolvidos e apontou o programa Patrulha da Paz como importante ferramenta para o enfrentamento à violência doméstica e no combate à impunidade dos agressores.
Ele explicou que o programa permitirá um cadastro completo da vítima, com histórico de atendimentos, além de que a forma como os dados são registrados podem auxiliar nos processos envolvendo a violência doméstica.
“Muitas vezes, quando a vítima chega às varas criminais, o momento de tensão do ciclo da violência passou e ela reconstruiu a relação com o agressor, fazendo com que mude o discurso perante a Justiça e tente negar as agressões”, iniciou.
“Com este programa, aquela versão apresentada no momento do acionamento da Patrulha da Paz pode ser levado ao processo criminal e o juiz, durante o julgamento, pode levar em consideração aquilo que foi passado para a GCM no dia dos fatos. Então, é muito importante este dispositivo”, acrescentou o promotor.
Além do lançamento da Patrulha da Paz, a solenidade marcou a entrega de quatro viaturas adaptadas e equipadas para uso exclusivo do programa, que devem auxiliar no desenvolvimento das ações de enfrentamento à violência doméstica.
Os carros foram doados pelo Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, por meio de autorização da desembargadora da 3ª Câmara do TRT-15, e são oriundos de acordo judicial entre o Ministério Público do Trabalho e a Ford Motor Company Brasil Ltda.
A desembargadora explicou que a indenização é fruto de ação civil pública movida pelo MPT-15 em face da constatação de irregularidades na contratação de trabalhadores terceirizados para o campo de provas da Ford em Tatuí.
A desembargadora assinou termo de reconciliação judicial com a empresa, em setembro de 2019, no valor de R$ 10.007.840. Nos termos do acordo, a empresa se comprometeu a pagar R$ 6.007.840 por meio da entrega de bens móveis.
A entrega foi materializada em 116 automóveis do modelo Fiesta, ano 2019, com garantia de fábrica (semelhante àquela concedida aos veículos comercializados pela empresa), dos quais 15 acabaram destinados a entidades de Tatuí.
Os outros R$ 4 milhões, foram divididos em oito parcelas iguais de R$ 500 mil, destinadas à Associação Procordis de Araraquara (R$ 1 milhão), entidade indicada pela desembargadora, e à Casa Maria de Nazaré (R$ 3 milhões), instituição de Campinas, indicada pelo MPT.
“Quando surgiu a conciliação e o acordo estava fechado, eu apontei que não poderíamos esquecer que tudo começou em Tatuí e que deveríamos destinar alguns carros para a cidade. Fizemos um levantamento das entidades e destinamos os veículos”, afirmou.
“Não posso deixar de fazer um agradecimento especial a Naira Brasil, minha assessora de gabinete, que se dedicou de corpo e alma para fazer o levantamento das entidades sociais que deveriam ser indicadas”, continuou.
Antonia ainda destacou a importância do lançamento do programa para o município e para o combate à violência doméstica e aos casos de feminicídio.
“Este momento é muito importante para nós do tribunal. Este momento onde estamos doando essas viaturas, na verdade, se iniciou um pouco triste, mas terminou em um acordo que acabou beneficiando a população, e a gente fica muito feliz”, declarou a desembargadora.
Ela revelou ter ficado em dúvida quanto à doação dos veículos para a GCM, no início, e que, antes de finalizar o processo, recebeu os representantes da GCM no TRT para que eles pudessem apresentar o projeto.
“Ainda nem tinha um nome para o programa, mas recebi a GCM no meu gabinete e, depois que eles me mostraram como seria, fiquei surpresa com a grandiosidade do projeto. Estou muito feliz por ter contribuído, e gostaria muito que este programa fosse divulgado e implantado em outras cidades também”, declarou a desembargadora.
Finalizando os discursos, Maria José destacou que o programa fora idealizado a partir de sugestões de setores da sociedade, devido aos índices de violência doméstica registrados no município, que têm sido crescentes.
Conforme dados da Delegacia de Defesa da Mulher, divulgados pela prefeita, só em 2019 foram 11 estupros, 45 estupros de vulnerável, 186 lesões corporais dolosas, 186 boletins de ocorrência, 459 inquéritos e 74 prisões efetuadas.
“A Patrulha da Paz é um projeto de apoio à mulher vítima de violência doméstica e que fiscaliza o cumprimento das medidas protetivas e de segurança. É um instrumento a mais na luta contra a violência”, enfatizou.
Além de ser equipada com viaturas exclusivas, a prefeita destacou que a “Patrulha” é formada por um grupo de guardas municipais treinados para atender ocorrências de violência doméstica. Ela também enalteceu o trabalho da desembargadora na destinação dos veículos.
“Quero agradecer a doutora Antonia pelo alto espírito de Justiça. Sem o apoio dela, não teríamos recebido estes quatro veículos que serão ferramentas importantes no nosso trabalho, de não só proteger as mulheres, mas também dar a elas a qualidade de vida que elas têm direito”, concluiu.
Para finalizar a cerimônia, a GCM entregou placas de agradecimento à prefeita, à desembargadora e ao juiz de direito Salmaso. Logo depois, os participantes foram convidados a conhecer as viaturas, que estavam estacionadas na praça do paço municipal.
A O Progresso, a desembargadora reforçou a importância do acordo judicial para a destinação dos veículos, não só os que foram doados para a GCM, mas também às outras entidades assistenciais beneficiadas.
Além da GCM, outras 11 instituições da cidade receberam o mesmo veículo, por meio da ação trabalhista. Entre elas, a Apae (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais), o Recanto do Bom Velhinho, a Casa do Bom Menino, o Lar Donato Flores, o Lar São Vicente de Paulo, o Arte Pela Vida, o Cosc (Centro de Orientação e Serviços à Comunidade), a Litac (Liga Tatuiana de Assistência a Cancerosos), o Força Para Viver, o Banco de Sangue “Fortunato Minghini” e o Conselho Tutelar.
“Nós finalizamos este processo, a Ford fez o acordo, o MP homologou, nós concordamos e foi assim um acordo que nos trouxe muita alegria, porque nós conseguimos ajudar algumas entidades, isso é uma alegria muita grande”, concluiu a desembargadora.