Como diria o apresentador dominical Fausto Silva, “mais do que nunca” é preciso extrema responsabilidade para a definição de votos neste final de semana. Em xeque, não apenas o futuro vencedor do pleito, mas a própria sobrevivência da democracia.
Sim, é certo que a liberdade de se manifestar, o direito de levar a público as opiniões pessoais e de receber as informações sem censura já não significam mais nada para boa parte da população.
Por um aspecto, esses privilégios inerentes à democracia assemelham-se a ter saúde, algo a que o indivíduo só dá valor quando perde. No momento, contudo, a doença epidêmica no país é o ódio, cujo sintoma maior contamina os engajamentos sectários.
O cidadão comum – esse que mais sente as dores generalizadas neste momento de tantas enfermidades -, quando na condição de eleitor, deveria estar optando pelos melhores – ou menos ruins – e, assim, prevenindo-se a eventuais agravantes no quadro clínico da política nacional,
No entanto, em grande maioria, com ódio, está seguindo a opção por abater o inimigo, entendendo estar remediando o mal maior, que seria aquele com convicções contrárias, sejam quais forem, de esquerda ou direita – tanto faz.
Esta situação já está posta e consolidada, segundo praticamente todas as pesquisas de opinião. A partir deste diagnóstico, resta o temor quanto à evolução do dissenso, de tal azar que ainda pode levar a democracia à fatalidade.
Por associação, pode-se entender que as doenças nacionais precisam ser enfrentadas, sendo elas marcadas pela corrupção, pelo desemprego, pelas debilidades de segurança, educação e tantas outras. Entretanto, o que não se pode ignorar é a irracionalidade do pior tratamento de todos, segundo o qual, para acabar com as doenças, basta matar o paciente – em alusão a outra sábia máxima popular.
Salvo as literais vítimas comumente impostas pelos estados totalitários – novamente, a despeito de suas aparentes opostas ideologias -, o paciente, no caso, é a própria democracia brasileira.
Notadamente, não seria por outro motivo que as ameaças ao paciente sempre atacam a Constituição. Isto porque a Carta Magna é como o sistema de defesa de todo o corpo social, responsável por defendê-lo dos vírus sinistros do autoritarismo, da opressão, das injustiças.
Até se poderia observar que, “coincidentemente”, a Constituição brasileira está completando 30 anos neste dia 5 de outubro. Mas, não. Fato é que, seguindo um ciclo razoavelmente constante de três décadas, o país flutua e submerge, ao longo de sua história, entre períodos mais democráticos e totalitários.
Há 30 anos, portanto, o Brasil consolidava o fim de uma era ditatorial e iniciava novo ciclo, marcado justamente por uma nova Constituição – não por acaso, chamada de “Cidadã”.
A promulgação desse texto constitucional é considerada o ápice do movimento pela redemocratização do país. Durante quase uma década antes dela, amplos segmentos sociais exigiram desde o fim da tortura e das prisões arbitrárias até eleições diretas para presidente.
Tal processo político resultou na “Constituição Cidadã” e permitiu que a Assembleia Nacional Constituinte promulgasse texto tido como um dos mais modernos do mundo e que deu esperanças à sociedade de efetivar direitos e um modelo de Estado de “bem-estar social”, mais justo para todos.
Pela predisposição histórica, não obstante, há grandes chances de o país afundar em mais um ciclo de opressão e perda de direitos fundamentais, matando a democracia em nome da ilusão de que, com o enterro dela, também sigam para a cova as mazelas sociais e políticas do momento.
Claro, há quem pense diferente; quem creia que o lobo perde o vício junto com os pelos; que a democracia, apesar de imberbe, já é consistente e sólida…
Que estes estejam certos e todos nós, brasileiros, não tenhamos que nos virar nos próximos 30 anos com medo, instrumento maior de dominação pela opressão antidemocrática.
Que a democracia tenha forças para sobreviver a este pleito – que o paciente se recupere e, se possível, saia ainda mais fortalecido da UTI eleitoral.