Vítimas de violência ou abuso sexual em Tatuí precisam aguardar até quatro dias para serem submetidas a exame pericial. O procedimento é realizado pelo IML (Instituto Médico Legal), em Itapetininga.
Segundo o vereador Miguel Lopes Cardoso Júnior (PMDB), as pessoas que procuram atendimento ainda recebem recomendação de não tomarem banho até a coleta dos materiais genéticos.
O edil tratou do assunto em requerimento apresentado à prefeita Maria José Vieira de Camargo (PSDB). Por meio do documento, ele sugere a criação de uma sala privativa para atendimento às vítimas.
A função da sala seria possibilitar que as pessoas tenham “respaldo necessário e imediato” quando sofrerem abusos. Cardoso Júnior classificou esse tipo de crime como bárbaro.
Ele disse que as pessoas são violentadas diariamente “nos mais diversos lugares”. “E esse número cresce assustadoramente, inclusive, em nosso município, e debaixo do nosso nariz”, declarou.
De acordo com o vereador, o futuro espaço permitiria amparo às vítimas, provendo atendimentos psicológicos e orientações.
A proposta de criação da sala surgiu após a participação do vereador em capacitação de multiplicadores no combate à pedofilia e violência sexual contra crianças e adolescentes.
O curso, oferecido a 40 pessoas, teve duração de dois dias, ministrado pela médica legista e sexóloga, Mariana da Silva Ferreira. Ela é fundadora do Prodigs, projeto social sem fins lucrativos, de promoção à dignidade sexual com enfoque na prevenção do abuso infantil e da pedofilia.
Segundo o parlamentar, durante o curso, a profissional falou acerca das dificuldades que as vítimas encontram em receber atendimento ou denunciarem. Cardoso Júnior disse que, as de Tatuí, acabam sendo prejudicadas pela falta de uma unidade do IML, gerando situação ainda mais traumática.
A questão se agrava quando os crimes ocorrem às sextas-feiras. O vereador afirmou que, quando uma pessoa procura o órgão policial (na maioria das vezes, a DDM – Delegacia de Defesa da Mulher), perto do fim de semana, ela é orientada a registrar boletim de ocorrência e a aguardar data para a perícia. Em geral, os atendimentos são feitos somente na segunda-feira subsequente.
Além de considerar a situação constrangedora, Cardoso Júnior afirmou que a espera pode colocar em risco “todo o procedimento médico”, já que, em quatro dias, os indícios poderiam ser atenuados por conta da recuperação do corpo da vítima.
“Estamos pedindo um espaço de acolhimento, porque os casos acontecem diuturnamente. E nós não temos, na cidade, uma sala que acolha a vítima, que faça os primeiros socorros”, argumentou.
Na apresentação da proposta, o vereador ainda aventou a possibilidade de a sala contar – a partir de convênio entre a Prefeitura e o governo do Estado – com um plantonista do IML.
Ele seria responsável por analisar a situação das vítimas, avaliar a gravidade dos casos e encaminhar eventuais materiais coletados (como fios de cabelo e roupas) para exames e demais providências.
Entretanto, Cardoso Júnior disse que a principal meta é o acolhimento ao cidadão. Ele afirmou que, na maioria das vezes, os atendimentos são feitos por homens e que as pessoas violentadas “ficam sem respaldo físico e psicológico”.
Durante uma semana, a reportagem de O Progresso procurou a SSP (Secretaria de Segurança Pública) do Estado para confirmar as informações tornadas públicas pelo parlamentar. Também solicitou dados sobre como as vítimas devem proceder quando houver abuso ou violência sexual. No entanto, não recebeu resposta até o fechamento desta edição (terça, 17h).
Diretrizes
No Brasil, vítimas de violência sexual têm atendimentos previstos em portaria do Ministério da Saúde. O dispositivo estabelece diretrizes que visam à implementação, em âmbito nacional, do registro de informações e coleta de vestígios durante o atendimento, prestado em hospitais, às vítimas de violência sexual.
O objetivo é tornar o atendimento mais humanizado, de modo a reduzir a exposição da pessoa que sofreu a violência, evitando que ela seja submetida a vários procedimentos. Também, busca oferecer elementos à responsabilização de autores da violência.
De acordo com o Ministério da Saúde, o registro de informações e a coleta de vestígios no momento do atendimento em saúde contribuem para o combate à impunidade, com a realização do exame nas primeiras horas após a violência.
De janeiro a setembro deste ano, em Tatuí, a SSP registrou 51 crimes sexuais, sendo 31 casos de estupros e outros 20 de estupros de vulnerável (contra crianças e adolescentes e pessoas que sofram de enfermidades ou deficiência mental). O número é 21,42% maior que o registrado durante todo o ano passado.
Em 2016, houve 35 casos de estupros na cidade, de janeiro a dezembro, queda de 11,42% em comparação com os nove meses deste ano. Já os estupros de vulneráveis, que somaram sete, aumentaram 185,8% no mesmo período.